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quinta-feira, outubro 07, 2004

Alicerçando Poesia #13 - Czeslaw Milosz



PEQUENO POEMA SOBRE O FIM DO MUNDO

Quando chegar o fim do mundo,
A abelha estará sobrevoando a espora-de-galo,
O pescador estará consertando a rede brilhante,
Os delfins estarão saltando alegres no mar,
Os pardais estarão se reunindo sobre o telhado,
A pele da cobra brilhará como sempre.

Quando chegar o fim do mundo,
As mulheres irão para debaixo dos guarda-sóis,
O bêbado adormecerá em algum lugar sobre a relva,
Os verdureiros farão suas vendas gritando,
O barco a vela amarela chegará à ilha,
As violas soarão no ar,
Abrindo a noite estrelada.

Quem esperar raios e trovões
Vai decepcionar-se;
Quem aguardar um sinal e trombetas de anjos,
Nem acreditará que o fim já chegou.

Enquanto o sol e a lua brilharem acima,
Enquanto o inseto visitar a rosa,
Enquanto crianças coradas ainda se alegrarem,
Ninguém acreditará que o fim já chegou.

Até que o velhote grisalho, que poderia ser profeta,
Mas não é profeta, porque o seu trabalho é outro,
Dirá ao amarrar tomates:
Nem haverá um outro fim do mundo.



HISTÓRIA DA LITERATURA POLONESA


Lá, onde as gaivotas dormindo em névoas nadam sobre
superfícies tranqüilas,
e além, onde navios sobem e descem.
A notícia a esse respeito corre sob a luz da montanha,
mostrando o poeta à mesa,
no quarto frio, numa cidade pouco conhecida,
quando o relógio bate na torre.
Seu lar está nos espinhos do pinheiro, no balido da corça,
Na explosão das estrelas dentro do punho.
O relógio não lhe mede o poema. Ribomba
como a idade do mar na profundeza da concha
que jamais silencia. Dura. E o seu sussurro
que imita os homens é forte.

Feliz o povo que possui poetas
e em seus tormentos não caminha calado.
Apenas os oradores não gostam dos poetas




ARS POETICA

Sempre aspirei por uma forma mais ampla,
que não fosse nem poesia nem prosa em demasia
e permitisse a compreensão, sem expor ninguém,
nem autor nem leitor, a grandes tormentos.

Em sua essência, a poesia é algo horrível:
Nasce de nós uma coisa que não sabíamos que está dentro de
nós,
e piscamos os olhos como se atrás de nós tivesse saltado um
tigre,
e tivesse parado na luz, batendo a cauda sobre os quadris.
É por isso que se afirmam, com razão, que a poesia é ditada
por um espírito,
Embora haja exagero em afirmar que se trata de um anjo.
É difícil entender a soberba dos poetas,
Por que se envergonham, quando a fraqueza deles acaba
descoberta.
Que homem inteligente gostaria de ser o país dos demônios,
que nele se multiplicam como em sua própria casa, falam
inúmeras línguas,
e como se não lhes bastasse roubar-lhe a boca e as mãos,
ainda tentam alterar-lhe o destino a seu bel-prazer?

Porque hoje se respeita tudo o que é adoentado,
alguém poderá pensar que estou brincando apenas,
ou que encontrei uma outra maneira
de elogiar a Arte através da ironia.

Houve um tempo em que somente livros sábios eram lidos,
que ajudam a suportar a dor e a desgraça.
Mas isso não é o mesmo que examinar milhares
de obras oriundas direto das clínicas psiquiátricas.

Mas o mundo é diferente daquilo que nos parece,
e nós próprios diferentes de nossos delírios.
Por isso as pessoas conservam a sua silente cortesia,
para obter respeito de parentes e vizinhos.

A vantagem da poesia consiste no fato de lembrar-nos
da dificuldade de manter a identidade,
pois a nossa casa está aberta, não há chave na porta,
e hóspedes invisíveis entram e saem.

Concordo, o que estou contando aqui não é poesia.
Poesias devem ser escritas poucas vezes e de má vontade,
sob uma pressão insuportável e apenas na esperança
de que os bons espíritos, e não os maus, tenham em nós o seu
instrumento.