Alicerçando Poesia # 44 - Ted Hughes (1930-1998)
VENTO
A casa esteve toda a noite lá longe, no mar,
o bosque quebrando entre a escuridão, os montes troando,
o vento fustigando os campos sob as janelas,
também ele escuro nos seus volteios, cego e molhado,
até ao nascer do dia. Então, sob um céu alaranjado,
viam-se nesses montes lugares novos, o vento trazia
uma luz cortante, luminosidade negra e esmeralda
a ondular como se vista pelas lentes de uns olhos loucos.
Pelo meio-dia trepei por uma das paredes da casa
até à porta do depósito de carvão. Ousei olhar mais para cima:
por entre a força do vento que amolgava os meus olhos
os montes pareciam tendas a ressoar, retesadas nas cordas,
os campos estremeciam e via-se um esgar na linha do horizonte,
na iminência de rebentar e desaparecer com mais uma chicotada:
o vento arrancava dali uma pega e um alcatraz
de cauda preta a dobrar-se devagar como uma barra de ferro. A casa
retinia como se fosse uma fina taça verde prestes
a estilhaçar-se a qualquer momento. Enfiados
nas cadeiras frente ao lume, aperta-se-nos
o coração e não há livro ou pensamento que nos distraia nem somos
capazes de nos distrair uns com os Outros. Olhamos o fogo a arder
e sentimos tremer os alicerces da casa, mas permanecemos sentados
vendo a janela a abanar, quase a cair para dentro,
ouvindo o grito das pedras sob o horizonte.
O Fazer da Poesia
tradução de Helder Moura Pereira
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