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sexta-feira, agosto 10, 2007

Alicerçando Palavras # 130 - Ilse Losa


(...)Finalmente comecei a contar coisas. Mas só me apercebi de que ele me estava a escutar quando, na altura em que falei de crianças, me interrompeu:

- Eu via levarem crianças às carradas para a câmara da morte com acompanhamento de música sinfónica.

Ao despedir-me afaguei-lhe, ao de leve, o rosto amargurado de tanto saber e deixei-o, na solidão, com os seus monstros.

Tive notícias de que morreu e de que no último ano da sua existência de sobrevivente lhe fora concedida a clemência de uma segunda meninice. Tudo o resto apagara-se-lhe da memória. Ainda via os filmes de animais, mas não se flagelava com o noticiário para se certificar de que a História dos Homens é feita de crueldades. Montava cavalos, picava-os com esporas e gritava: Anda! Houp! Também dizia a pequena oração da noite que a mãe lhe ensinara e que acabava assim: "Protege-me, Senhor, para que nada de mal me aconteça no dia de amanhã. Amen."



Ilse Losa, Caminhos sem Destino, extracto do conto O Sobrevivente ou Buchenwald



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