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sexta-feira, setembro 29, 2006

Alicerçando Poesia # 210 - Francesco Petrarca


Anima Bella da Quel Nodo Sciolta

Alma tão bela desse nó já solta
Que mais belo não sabe urdir natura,
Tua mente volve à minha vida obscura
Do céu à minha dor em choro envolta.

Da falsa suspeição liberta e absolta
Que outrora te fazia acerba e dura
A vista em mim pousada, ora segura
Podes fitar-me, e ouvir-me a ânsia revolta.

Olha do Sorge a montanhosa fonte
E verás lá aquele que entre o prado e o rio
De recordar-te e de desgosto é insonte.

Onde está teu albergue, onde existiu
O amor que abandonaste. E o horizonte
De um mundo que desprezas, torpe e frio.



Tradução de Jorge de Sena



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terça-feira, setembro 26, 2006

Alicerçando Palavras # 115 - René Char


Brusquement tu te souviens que tu as un visage.


Nous avons recensé toute la douleur qu'éventuellement le bourreau pouvait prélever sur chaque pouce de notre corps; puis le coeur serré, nous sommes allés et avons fait face.


Feuillets d'Hypnos



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sábado, setembro 23, 2006

Alicerçando Poesia # 209



O MEU CACHIMBO
(Coimbra, 1889)

Ó meu cachimbo! Amo-te immenso!
Tu, meu thuribulo sagrado!
Com que, Sr. Abbade, incenso
A Abbadia do meu passado.

Fumo? E occorre-me à lembrança
Todo esse tempo que lá vae,
Quando fumava, ainda criança,
Ás escondidas do meu Pae.

Vejo passar a minha vida,
Como n'um grande cosmorama:
Homem feito, pallida Ermida,
Infante, pela mão da ama.

Por alta noite, ás horas mortas,
Quando não se ouve pio, ou voz,
Fecho os meus livros, fecho as portas
Para fallar comtigo a sós.

E a noite perde-se em cavaco,
Na Torre d'Anto, onde eu moro!
Alli, mettido no buraco
Fumo e, a fumar, ás vezes... choro.

Chorando (penso e não o digo)
Os olhos fitos n'este chão,
Que tu és leal, és meu amigo...
Os meus Amigos onde estão?

Não sei. Tral-os-á o "nevoeiro"...
Os tres, os intimos, Aquelles,
Estão na Morte, no estrangeiro...
Dos mais não sei, perdi-me d'elles.

Morreram-me uns. Por esses peço
A Deus, se elle está de maré:
E, ás noites, quando eu adormeço,
Phantasmas, vêm, pé ante pé...

Tristes, nostalgicos da cova,
Entram. Sorrio-lhes e fallo,
Deixam-se estar na minha alcova,
Até se ouvir cantar o gallo.

Outros, por esses cinco Oceanos,
Por esse Mundo erram, talvez:
Não me escreveis, ha tantos annos!
Que será feito de Vocês?

Hoje, delicias do abandono!
Vivo na Paz, vivo no limbo:
Os meus Amigos são o Outomno,
O Mar e tu, ó meu Cachimbo!

Ah! quando fôr do meu enterro,
Quando partir gelado, emfim,
N'algum caixão de mogno e ferro,
Quero que vás ao pé de mim.

Sancta mulher que me tratares,
Quando em teus braços desfalleça,
Cazo meus olhos não cerrares,
Embora! que isto não te esqueça:

Colloca, sob a travesseira,
O meu cachimbo singular
E enche-o, sollicita Enfermeira,
Com Gold-Fly, para eu fumar...

Como passar a noite, Amigo!
No Hotel da Cova sem confoto?
Assim, levando-te commigo,
Esquecer-me-ei de que estou morto...


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terça-feira, setembro 19, 2006

Alicerçando Palavras # 114 - Yasunari Kawabata


Chieko descobriu as violetas que floresciam no velho tronco de carvalho.

"Floriram também este ano." Com estas palavras foi ao encontro da doce Primavera.


Yasunari Kawabata, Kyoto, Publicações Dom Quixote, 2000



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domingo, setembro 17, 2006

Alicerçando Poesia # 208 - Dom Francisco Manuel de Melo


Alegria Custosa

Enfim que aquela hora é já chegada,
Que até nos passos traz preço e ventura,
Tão merecida de uma fé tão pura,
E de um tão limpo amor tão esperada.

Ela tardou em vir, como rogada
Da viva saudade, que ainda dura.
Ora bem pode vir, e estar segura,
Que há de ser possuída a desejada.

Senhora, se com lágrimas convinha
Sentir somente o mal, e agora o canto,
É digno de outra glória verdadeira;

Não cuideis que é fraqueza da alma minha,
Mas que, de costumada sempre ao pranto,
Não sabe festejar de outra maneira.


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terça-feira, setembro 12, 2006

Alicerçando Poesia # 207 - Antonio Cisneros - Peru


Contra la flor de la canela

Para hacer el amor
debe evitarse un sol fuerte sobre los ojos de la muchacha,
tampoco la sombra es buena si el lomo
del amante se achicharra para hacer el amor.

Los pastos húmedos son mejores que los pastos amarillos
pero la arena gruesa es mejor todavía.
Ni junto a las colinas porque el suelo es rocoso
ni cerca de las aguas.
Poco reino es la cama para este buen amor.

El cielo debe ser azul y amable, limpio y redondo
como un lecho y entonces
la muchacha no verá el dedo de Dios.

Los cuerpos discretos pero nunca en reposo,
los pulmones abiertos,
las frases cortas.
Es difícil hacer el amor pero se aprende.



Agua que no has de beber



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domingo, setembro 10, 2006

Alicerçando Fotos # 24



a paz dum lago no Dol de Bretagne


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quinta-feira, setembro 07, 2006

Alicerçando Músicas # 2


Este post é em especial para o grande "mundo" que comigo o ouviu em pleno Vercors depois de termos visitado o Museu da Resistência.




clique na seta para activar a música

Yves Montand, Le Chant de la Libération


Le Chant de la Libération

Ami, entends-tu le vol noir des corbeaux sur nos plaines ?
Ami, entends-tu les cris sourds du pays qu'on enchaîne ?
Ohé, partisans, ouvriers et paysans, c'est l'alarme.
Ce soir l'ennemi connaîtra le prix du sang et les larmes.

Montez de la mine, descendez des collines, camarades !
Sortez de la paille les fusils, la mitraille, les grenades.
Ohé, les tueurs à la balle et au couteau, tuez vite !
Ohé, saboteur, attention à ton fardeau: dynamite...

C'est nous qui brisons les barreaux des prisons pour nos frères.
La haine à nos trousses et la faim qui nous pousse, la misère.
Il y a des pays où les gens au creux des lits font des rèves.
Ici, nous, vois-tu, nous on marche et nous on tue, nous on crève...

Ici chacun sait ce qu'il veut, ce qu'il fait quand il passe.
Ami, si tu tombes un ami sort de l'ombre à ta place.
Demain du sang noir sèchera au grand soleil sur les routes.
Chantez, compagnons, dans la nuit la Liberté nous écoute...

Ami, entends-tu ces cris sourds du pays qu'on enchaîne ?
Ami, entends-tu le vol noir des corbeaux sur nos plaines ?
Ohé, partisans, ouvriers et paysans, c'est l'alarme.
Ce soir l'ennemi connaîtra le prix du sang et les larmes.


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terça-feira, setembro 05, 2006

Alicerçando Palavras # 113 - Fernando Pessoa

"...E contudo - penso-o com tristeza - pus no Caeiro todo o meu poder de despersonalização dramática, pus em Ricardo Reis toda a minha disciplina mental, vestida da música que lhe é própria, pus em Álvaro de Campos toda a emoção que não dou nem a mim nem à vida. Pensar, meu querido Casais Monteiro, que todos estes têm que ser, na prática da publicação preteridos pelo Fernando Pessoa, impuro e simples!

Creio que respondi à sua pergunta.

Se fui omisso, diga em quê. Se puder responder, responderei. Mais planos não tenho, por enquanto. E, sabendo eu o que são e em que dão os meus planos, é caso para dizer, Graças a Deus!

Passo agora a responder à sua pergunta sobre a génese dos meus heterónimos. Vou ver se consigo responder-lhe completamente.

Começo pela parte psiquiátrica. A origem dos meus heterónimos é o fundo traço de histeria que existe em mim. Não sei se sou simplesmente histérico, se sou, mais propriamente, um histeroneurasténico. Tendo para esta Segunda hipótese, porque há em mim fenómenos de abulia que a histeria, propriamente dita, não enquadra no registo dos seus sintomas. Seja como for, a origem mental dos meus heterónimos está na minha tendência orgânica e constante para a despersonalização e para a simulação. Estes fenómenos - felizmente para mim e para outros - mentalizaram-se em mim; quero dizer, não se manifestam na minha vida prática, exterior e de contacto com outros; fazem explosão para dentro e vivo-os eu a sós comigo. Se eu fosse mulher - na mulher os fenómenos histéricos rompem em ataques e coisas parecidas - cada poema de Álvaro de Campos (o mais histericamente histérico de mim) seria um alarme para a vizinhança. Mas sou homem - e nos homens a histeria assume principalmente aspectos mentais: assim tudo acaba em silêncio e poesia.

Isto explica, tant bien que mal, a origem orgânica do meu heteronismo. Vou agora fazer-lhe a história directa dos meus heterónimos. Começo por aqueles que morreram, e de alguns dos quais já me não lembro - os que jazem perdidos no passado remota da minha infância quase esquecida.


...


Aí por 1912, salvo erro (que nunca pode ser grande), veio-me à ideia escrever uns poemas de índole pagâ. Esbocei umas coisas em verso irregular (não no estilo Álvaro de Campos, mas num estilo de meia regularidade), e abandonei o caso. Esboçara-s-me, contudo, numa penumbra mal urdida, um vago retrato da pessoa que estava a fazer aquilo (tinha nascido, sem que eu soubesse, o Ricardo Reis).

Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro - de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira - foi em 8 de Março de 1914 - acerquei-me de uma cómoda alta, e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com o título Guardador de Rebanhos. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre. Foi essa a sensação imediata que tive. E tanto assim que, escrito que foram esses trinta e tantos poemas, imediatamente peguei noutro papel e escrevi, a fio, também, os seis poemas que constituem a Chuva Oblíqua, de Fernando Pessoa. Imediatamente e totalmente. Foi o regresso de Fernando Pessoa - Alberto Caeiro a Fernando Pessoa - ele só. Ou, melhor, foi a reacção de Fernando Pessoa contra a sua inexistência como Alberto Caeiro.

Aparecido Alberto Caeiro, tratei logo de lhe descobrir - instintiva e subconscientemente - uns discípulos. Arranquei do seu falso paganismo o Ricardo Reis latente, descobri-lhe o nome, e ajustei-me a si mesmo, porque nessa altura já o via. E, de repente, e em derivação oposta à de Ricardo Reis, surgiu-me impetuosamente um novo indivíduo. Num jacto, e à máquina de escrever, sem interrupção nem emenda, surgiu a Ode Triunfal de Álvaro de Campos - a Ode com esse nome e o homem com o nome que tem.

Criei, então uma coterie inexistente. Fixei aquilo tudo em moldes de realidade. Graduei as influências, conheci as amizades, ouvi, dentro de mim, as discussões e as divergências de critérios, e em tudo isto me parece que fui eu, criador de tudo, o menos que ali houve. Parece que tudo se passou independentemente de mim. E parece que assim ainda se passa. Se algum dia eu puder publicar a discussão estética entre Ricardo Reis e Álvaro de Campos, verá como eles são diferentes, e como eu não sou nada na matéria.

Quando foi da publicação de Orpheu, foi preciso, à última hora, arranjar qualquer coisa para completar o número de páginas. Sugeri então ao Sá-Carneiro que eu fizesse um poema "antigo" do Álvaro de Campos - um poema de como o Álvaro de Campos seria antes de ter conhecido Caeiro e ter caído sob a sua influência. E assim fiz o Opiário, em que tentei dar todas as tendências latentes do Álvaro de Campos, conforme haveriam de ser depois de reveladas, mas sem haver ainda qualquer traço de contacto com o seu mestre Caeiro. Foi dos poemas que tenho escrito, o que me deu mais que fazer, pelo duplo poder de despersonalização que tive que desenvolver. Mas, enfim, creio que não saiu mau, e que dá o Álvaro em botão...

Creio que lhe expliquei a origem dos meus heterónimos. Se há porém qualquer ponto em que precise de um esclarecimento mais lúcido - estou escrevendo depressa, e quando escrevo depressa não sou muito lúcido -, diga, que de bom grado lho darei. E, é verdade, um complemento verdadeiro e histérico: ao escrever certos passos das Notas para recordação do meu Mestre Caeiro, do Álvaro de Campos, tenho chorado lágrimas verdadeiras. É para que saiba com quem está lidando, meu caro Casais Monteiro!

Mais uns apontamentos nesta matéria... Eu vejo diante da mim, no espaço incolor mas real do sonho, as caras, os gestos de Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Construí-lhes as idades e as vidas. Ricardo Reis nasceu em 1887 não me lembro do dia e mês (mas tenho-os algures), no Porto, é médico e está presentemente no Brasil. Alberto Caeiro nasceu em 1889 e morreu em 1915; nasceu em Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão nem educação quase alguma. Álvaro de Campos nasceu em Tavira, no dia 15 de Outubro de 1890 (às 1,30 horas da tarde, diz-me o Ferreira Gomes; e é verdade, pois, feito o horóscopo para essa hora, está certo). Este, como sabe é engenheiro naval (por Glasgow), mas agora está aqui em Lisboa em inactividade. Caeiro era de estatura média, e, embora realmente frágil (morreu tuberculoso), não parecia tão frágil quanto era. Ricardo Reis é um pouco, mas muito pouco, mais baixo, mais forte, mais seco. Álvaro de Campos é alto (1,75m de altura, mais 2 cm do que eu), magro e um pouco tendente a curvar-se. Cara rapada todos - o Caeiro louro sem cor, olhos azuis; Reis de um vago moreno mate; Campos entre branco e moreno, tipo vagamente de judeu português, cabelo, porém, liso e normalmente apartado ao lado, monóculo. Caeiro, como disse, não teve mais educação que quase nenhuma - só instrução primária; morreram-lhe cedo e pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de uns pequenos rendimentos. Vivia com uma tia velha, tia-avó. Ricardo Reis, educado num colégio de jesuítas, é, como disse, médico: vive no Brasil desde 1919, pois se expatriou espontaneamente por ser monárquico. É um latinista por educação alheia, e um semi-helenista por educação própria. Álvaro de Campos teve uma educação vulgar de liceu; depois foi mandado para a Escócia estudar engenharia, primeiro mecânica e depois naval. Numas férias fez a viagem ao Oriente de onde resultou o Opiário. Ensinou-lhe latim um tio beirão que era padre.

Como escrevo em nome desses três?... Caeiro por pura e inesperada inspiração, sem saber ou sequer calcular que iria escrever. Ricardo Reis, depois de uma deliberação abstracta, que sùbitamente se concretiza numa ode. Campos, quando sinto um súbito impulso para escrever e não sei o quê. (O meu semi-heterónimo Bernardo Soares, que aliás em muitas coisas se parece com Álvaro de Campos, aparece sempre que estou cansado ou sonolento, de sorte que tenha um pouco suspensas as qualidades de raciocínio e de inibição; aquela prosa é um constante devaneio. É um semi-heterónimo porque, não sendo a personalidade a minha, é, não diferente da minha, mas uma simples mutilação dela. Sou eu, menos o raciocínio e a afectividade. A prosa, salvo o que o raciocínio dá de ténue à minha, é igual a esta, e o português perfeitamente igual; ao passo que Caeiro escrevia mal o português, "eu próprio" em vez de "eu mesmo", etc., Reis melhor do que eu, mas com um purismo que considero exagerado. O difícil para mim, é escrever a prosa de Reis - ainda inédita - ou de Campos. A simulação é mais fácil, até porque é mais espontânea, em verso).



(Extractos duma carta escrita a Casais Monteiro. In PÁGINAS DE DOUTRINA ESTÉTICA, pags. 259 a 268)

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domingo, setembro 03, 2006

Alicerçando Poesia # 206 - Murilo Mendes


Anti-Elegia nº 3

As magnólias avançam com um ímpeto inesperado
São ombros nus é o luar o vidro de veneno
Deve haver um homicídio uma pergunta à esfinge
Um ultimato ao sonho um arroubo do universo.
À meia-noite em ponto bate o mar na varanda
É impossível deixar de acontecer alguma coisa
Há uma espera vã – raptaram as nebulosas.


Os Quatro Elementos, 1945



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