#footer { width:660px; clear:both; margin:0 auto; } #footer hr { display:none; } #footer p { margin:0; padding-top:15px; font:78%/1.6em "Trebuchet MS",Trebuchet,Verdana,Sans-serif; text-transform:uppercase; letter-spacing:.1em; }

segunda-feira, janeiro 31, 2005

Alicerçando Palavras # 39 - Ernest Hemingway (1899-1961)





Ernest Hemingway - 1928



My aim is to put down on paper what I see and what I feel in the best and simplest way.


There are some things which cannot be learned quickly, and time, which is all we have, must be paid heavily for their acquiring. They are the very simplest things, and because it takes a man's life to know them the little new that each man gets from life is very costly and the only heritage he has to leave.


Survival, with honor, that outmoded and all-important word, is as difficult as ever and as all-important to a writer. Those who do not last are always more beloved since no one has to see them in their long, dull, unrelenting, no-quarter-given-and-no-quarter-received, fights that they make to do something as they believe it should be done before they die. Those who die or quit early and easy and with every good reason are preferred because they are understandable and human. Failure and well-disguised cowardice are more human and more beloved.


What is moral is what you feel good after.


When people talk, listen completely. Most people never listen.



Never think that war, no matter how necessary, nor how justified, is not a crime.


Cowardice, as distinguished from panic, is almost always simply a lack of ability to suspend the functioning of the imagination.


A man can be destroyed but not defeated.


An intelligent man is sometimes forced to be drunk to spend time with his fools


Happiness in intelligent people is the rarest thing I know.


I always try to write on the principal of the iceberg. There is seven-eights of it under water for every part that shows. Anything you know you can eliminate and it only strengthens your iceberg. It is the part that doesn't show.


sábado, janeiro 29, 2005

Alicerçando Palavras # 38 - Jorge de Sena


CARTA A FERNANDO PESSOA


Meu caro Amigo


Se me não engano, é esta a segunda carta que V. recebe depois de morto. A outra, como deve estar lembrado, escreveu-lha Carlos Queiroz, que o conheceu pessoalmente. Não tive eu tanta honra, o que, pode crer, é um dos meus desgostos verdadeiros. No entanto, não lamento o desencontro. Apenas a curiosidade ficaria satisfeita; e, em contrapartida, jamais o Álvaro de Campos ou o Alberto Caeiro se revestiriam, a meus olhos, daquelas pungentes personalidades que lhes permitiu, e aos outros, o seu espírito sem realidade nenhuma. Porque esta é a verdade, meu Amigo: toda a sua tendência para a “despersonalização”, para a criação de poetas e escritores “heterónimos” e não pseudónimos, significa uma desesperada defesa contra o vácuo que V. sentia em si próprio e à sua volta. Quando V. criou o Álvaro de Campos, o Alberto Caeiro e o Ricardo Reis, quando fez deles um grupo de amigos seus, defendeu-se contra si próprio – e só não o tendo eu conhecido pessoalmente, não tendo, pois, assistido à irremediável ausência de qualquer deles, era possível cumprir-se em mim (ou noutros em idênticas circunstâncias, e para quem, também, a poesia não seja uma forma definitiva como um título consolidado) o que deve ter sido um dos mais melancólicos sonhos da sua vida.

V. não foi um mistificador, nem foi contraditório. Foi complexo, da pior das complexidades – a sensação do vácuo dentro e fora, V. não foi um poeta do Nada, mas, pelo contrário, poeta do excessivamente virtual, de toda a consciência trágica de probabilidade, que a crença no Destino não exclui.

Os seus heterónimos (e V. quando escreveu em seu próprio nome não foi menos heterónimo do que qualquer deles) não são as personagens independentes, protagonistas do “drama em gente”, do qual V. falou. Embora V. os visse, e os ouvisse e, por conta deles, se inspirasse, não representam um drama, nem vivem, em comum, o romance das “vidas que V. não queria ter”, segundo a expressão de Casais Monteiro – porque as biografias, que lhes deu, são ainda bem pouco para o que eles disseram... Poderei, com maior piedade do que lhe permitiu, a V., a sua lucidez devoradora, afirmar que essas vidas vieram depois, e amassadas com lágrimas que V. considerou imerecidas, que não quis gastar sobre a sua própria vida?

Quem lè as poesias assinadas com o seu nome, e as outras assinadas Álvaro de Campos, e depois as compara com as de Alberto Caeiro e Ricardo Reis, não sentirá como eu senti, que só a estes dois últimos pertencia a possibilidade poética de se erguerem, totalmente, acima do “Indefinido”? Esse Lucrécio e esse Horácio, com quem V. tentou raivosamente limitar-se; através dos quais tentou existir com o possível mínimo de ser; pela boca de Caeiro, afirmando o valor intacto do mundo exterior, embalsamado assim num devir inocente; pela boca de Reis, amando o quanto de gratuito a vida lhe podia conceder, uma vez que V. e a sua Lídia abstracta transformassem num só dia a vida inteira –

Inscientes (...) voluntariamente
Que há noite antes e após
O pouco que duramos.


- esse Lucrécio e esse Horácio, ambos tão incansáveis, tão resignado e indiferente o primeiro, e tão altivo o segundo, eram a sua revolta intelectual.


O Álvaro de Campos e o Pessoa que a V. ficou das sobras, esses eram da sua revolta sentimental. Eram quotidianos; eram o seu chegar à janela e ver a rua; eram a sua mágoa, quer de não estar em toda a parte, quer de estar em parte nenhuma, apesar do paliativo, que a V., quando em seu nome, lhe provinha de uma auto-submissão intelectual terrivelmente activa. Por isso o Álvaro de Campos escreveu a “Ode Marítima” e a “Tabacaria”; por isso o Fermando Pessoa escreveu os poemas da “Mensagem” e “O Menino da sua Mãe”. Ambos recordam a infância; e, para ambos, o passado é, como a infância, uma lembrança misteriosa que se não apaga. Lembrança de quê? Infância de quem? Muitas vezes perguntaram isso, mas a resposta era um silêncio e, mesmo (bem sabemos, não é?), um consultor dos astros, como verificação...


Não, meu Amigo! O D. Sebastião da “Mensagem” parece-se tão extraordinariamente com o Menino Jesus do “Guardador de Rebanhos” (“era o deus que faltava”...), que quase se suspeita da objectividade de “O Menino de sua Mãe”! É essa a fonte do espantoso vácuo que o cercava, meu Amigo: o vácuo da Terra, da qual o Sol se levanta, mas da qual não nasce!...

A noite, que V. poeticamente sentiu, como raríssimos poetas portugueses, com uma densidade e uma profundidade que a solidão lhe ensinou, foi o seu grande refúgio: nela a sua lucidez se alongava e expandia, é certo que dolorosamente, mas sem encontrar um objecto para o ataque, uma imagem a que antepor um cruel espelho.

Hoje, que a solidão e a lucidez perderam, para V., todo o sentido que tinham, reconheça comigo, que, se a elas ficou devendo uma inspiração sincera, lhes ficou devendo, também, o constante perigo de não conseguir se o grande Poeta que foi. A presença desse perigo é constante na sua obra; chega a tornar-se um dos temas fundamentais: e momentos houve, nos quais V. se comprazia em mergulhar nessa

... espécie de loucura
que é pouco chamar talento,


como se ela fosse, por si própria, uma virtualidade de expressão poética. Todavia, assemelhava-se a uma virtualidade poética: era um saber o som das asas cortando o ar... Assas tão grandes!... Tão consoladoras essas grandes asas!... E, depois, dizer o quê?... Se o dizer fosse o que fosse equivalia a restringir, a criar pequenos e pretensos mitos, em substituição dos outros maiores, tal como as palavras tinham sido criadas para esconjurar esses outros...


Não creio, portanto, que a morte o tenha prejudicado, meu Amigo: V. não diria mais do que disse; V. tinha dito sempre a mesma coisa – maravilhosamente, de quantas maneiras possíveis.

Veja, no entanto, as “Malhas que o Império tece”! Porque V., à parte o seu caso único na história das literaturas, para ser algo do Super-Camões que anunciara, não precisava de ter publicado uma espécie de Lusíadas, e de deixar as Líricas dispersas por revistas, ou amontoadas num baú, entregues às mãos do acaso e da amizade...


As suas obras estão sendo publicadas. O grande público decorará o seu nome; muitas pessoas o lerão; algumas o hão-de entender e amar. Outras desconfiarão de V. Outras, ainda, lamentarão secretamente aquela complexidade, de que já falámos, e que não pode servir de garantia a profecias ou realidades, para uso do “gado vestido dos currais dos Deuses”. Será tido como mistificador. Será tido como contraditório. Mas V., meu Amigo, já o sabia... E aquele sorriso vago, que flutura aquém dos seus retratos, para quem será, não é verdade?


Creia na imensa admiração e no imenso respeito do

Jorge de Sena
In, Fernado Pessoa & Cª Heterónima



1944

sexta-feira, janeiro 28, 2005

Alicerçando Poesia # 47 - Cecília Meireles



Motivo

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.


Retrato

Eu não tinha este rosto de hoje,
assim calmo, assim triste, assim magro,
nem estes olhos tão vazios,
nem o lábio amargo.

Eu não tinha estas mãos sem força,
tão paradas e frias e mortas;
eu não tinha este coração
que nem se mostra.

Eu não dei por esta mudança,
tão simples, tão certa, tão fácil:
- Em que espelho ficou perdida
a minha face?


Coração de Pedra

Oh, quanto me pesa
êste coração, que é de pedra!
Êste coração que era de asas
de música e tempo de lágrimas.

Mas agora é sílex e quebra
qualquer dura ponta de seta.

Oh, como não me alegra
ter êste coração de pedra!

Dizei por que assim me fizestes,
vós todos a quem amaria,
mas não amarei, pois sois êstes
que assim me deixastes, amarga,
sem asas, sem música e lágrimas,
assombrada, triste e severa
e com meu coração de pedra!

Oh, quanto me pesa
ver meu próprio amor que se quebra!
O amor que era mais forte e voava
mais que qualquer seta!



Apresentação

Aqui está minha vida - esta areia tão clara
com desenhos de andar dedicados ao vento.

Aqui está minha voz - esta concha vazia,
sombra de som curtindo o seu próprio lamento.

Aqui está minha dor - êste coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.

Aqui está minha herança - êste mar solitário
que de um lado era amor e, de outro, esquecimento.




Improviso de Amor-Perfeito

Naquela nuvem, naquela,
mando-te meu pensamento:
que Deus se ocupe do vento.

Os sonhos foram sonhados,
E o padecimento aceito.
E onde estás, Amor-Perfeito?

Imensos jardins da insónia,
de um olhar de despedida
deram flor por tôda a vida.

Ai de mim que sobrevivo
sem o coração no peito.
E onde estás, Amor-Perfeito?

Longe, longe, atrás do oceano
que nos meus olhos se alteia,
entre pálpebras de areia...

Longe, longe... Deus te guarde
sôbre o seu lado direito,
comeu eu te guardava do outro,
noite e dia, Amor-Perfeito.


quinta-feira, janeiro 27, 2005

Alicerçando Imagens # 28 - Victor Horta



Pormenor do exterior



Pormenor do interior


Museu Horta - Bruxelas - casa arte-nova do arquitecto Victor Horta.

quarta-feira, janeiro 26, 2005

Alicerçando Poesia # 46 - José Craveirinha - Moçambique - 1922-2004



Um Homem Nunca Chora

Acreditava naquela história
do homem que nunca chora.
Eu julgava-me um homem.
Na adolescência
meus filmes de aventuras
punham-me muito longe de ser cobarde
na arrogante criancice do herói de ferro.
Agora tremo.
E agora choro.
Como um homem treme.
Como chora um homem!


*******************

Aforismo

Havia uma formiga
compartilhando comigo o isolamento
e comendo juntos.
Estávamos iguais
com duas diferenças:
Não era interrogada
e por descuido podiam pisa-la.
Mas aos dois intencionalmente
podiam por-nos de rastos
mas não podiam
ajoelhar-nos.

(1968)

terça-feira, janeiro 25, 2005

Alicerçando Palavras # 37 - José Gil


Em Portugal, o Estado não somos nós, é "eles", uma instância transcendente.

domingo, janeiro 23, 2005

Alicerçando Palavras # 36 - Isabel Carmelo Rosa Renaud


CHAPTER XII

ETHICS AND LIFE


Ethics is the life of living. However brilliant and stimulating this formula might be, we must examine its pertinence so that it does not appear as vacuous bravado. The question is not merely rhetorical – what reasons lead one to entertain expectations; what may, today and tomorrow, rally one’s energies to a project considered solid and valid?
Psychiatrists’ and even psychologists’ consulting rooms are often frequented by young people who, although not depressive, declare, "I don’t feel motivated." The therapist will try to "get round" the lack of motivation by proposing directly or indirectly new sources of interest. In the end, after the invariable repetition, "That does not motivate me," he finds himself out of resources and must conclude that, indeed, the youngster is not motivated. It depends on the youngster alone – in part, probably on the youngster’s circumstances, too–but it does not constitute a disease. In other words, "to feel" or "to be motivated" depends on the human agent oneself, and no one can take the place of the non-motivated person. How can we read this example, which would be anecdotal if its frequency did not make it tragic?

MOTIVATION

Motivation depends on each human being and constitutes, therefore, an act by the subject. It may not be imposed from the outside. It is as if certain ideals were so appealing in themselves, in abstracto, that they have the power to involve and propel my will and trigger my action. An ideal or value that becomes attractive in an itself or in abstract manner, that is, regardless of how it relates to my will (or any concrete will), remains "abstract," not only in the sense of being "purely theoretical" but also in the sense of being "alien" to myself. Hence, inevitably, this ideal cannot motivate me, and thus I can claim that "I am not motivated." Motivation involves an active dimension of the person who agrees to turn to certain actions or values. In other words, the disease that affects motivation, taking the disease to be in this case a global absence or total loss of motivation, is a malady not of values but of the person in the way one acts. The common expression, "It’s not worth it," expresses almost literally that the possible project is not worth the "pain" its accomplishment requires, as if the expenditure of energy, physical, psychic, or spiritual needed to achieve a certain purpose were estimated to be higher than the expected benefit from that purpose. From a formal point of view, the "good" of the purpose contemplated by the projected action is placed on one side of the scales of ethical evaluation, while the "pains" or efforts are placed on the other side. In the light of this metaphor of the scales, absence of motivation means that the efforts–or trouble–are considered so heavy that they will allow no swaying of the scales to the side of the hypothetical project. Evidently, other reasons besides the degree effort may intervene to complicate the model. In general, the possible projects for action are multiple and the choice between them does not bring into play only the relation "good-paints" or "good-costs" (physical, psychological, financial, or spiritual), but also the intrinsic contents of the projected purposes. This situation diverts us from the case in which, in simple or general terms, a person does not appear motivated by anything. It is readily apparent that the absence of motivation never arises from absence of contents in the value itself, but from the irrelevance of that value to me or to my possibilities of action.
We may not conclude from this affirmation that the value exists per se independently of the action I take – every value, all values are intimately connected with action, although not necessarily with my action. Using Heidegger’s terminology, we might say that the value, as it relates to action in general, constitutes an "existentiary" (an existenzial moment), while the relationship between the value and "my" personal action constitutes the concretion in a unique individual of this "existentiary," and then represents the "existential" (existenziell) of the will.
This brief discussion enables one to understand how Merleau-Ponty’s aphorism, "Je suis la source absolue du sens," applies to the relationship between value and action. It is not a matter of interpreting this affirmation in its original context, but of highlighting its extension into the realm of values. When Merleau-Ponty enunciated, "I am the absolute source of meaning," he had understood that "meaning" intrinsically must cross my consciousness in order to exist as meaning. There is no such thing as a "meaning" that hovers above all consciousness, as if each one had to make an effort to appropriate a self-subsisting idea or theoretical entity.
Meaning exists only through consciousness, so that, strictly speaking, consciousness holds over meaning the power to not accord it existence. Consciousness controls meaning, not because it invents autocratically every possible meaning or interpretation of facts, events, and actions, but because every meaning must pass through consciousness, and be projected by it in order to acquire existential reality.
Values stand in the same relative position to consciousness as meaning. No value lives outside its assumption by active consciousness; from this point of view, I am "the absolute source of value." When I am not motivated, the fault does not derive necessarily from devaluation of the value itself but from the nonassumption or nonintegration of that value by my consciousness. Because we are talking of loss of values, of values that fall away or disappear, it is well to keep in mind that such loss affects the phenomenological experience [vivência] of the meaning of values, that is to say, the intrinsic dependence of values on consciousness.

THE HIERARCHICAL ORDERING OF VALUES

Ethics is the life of living precisely because life is the first value or the first good that enters consciousness. I mean life in general, not a certain lifestyle [forma de vida], because it is always possible to reject one lifestyle and choose another. No one disputes that several levels of lifestyle exist. What does matter is how the several lifestyles are structured or ordered into a hierarchy. The question is twofold: Is it possible to escape the hierarchical ordering of values; how does this hierarchical ordering of values present itself?
What is meant by lifestyle is a level of action whose motivation is the search for a good that is held to be preferable to many or to all others. Through our action, we have the capacity to achieve only an infinitesimal part of the range of theoretically achievable goals. That is why the motivation for action involves, on the one hand, fixing the attention on a certain goal and, on the other, forsaking other goals that are incompatible with our chosen goal. It is known that the pathology of decision often resides in the straying of attention, which, instead of staying fixed on the goal chosen by the will, lets itself be distracted by the goals forsaken, as if the sadness of having to renounce them invaded the field of attention dedicated to the goal that is effectively sought. To prevent this description from being limited to abstract statements, it should be reinserted it into the framework of concrete experience.
The act of eating is vital; we eat to nourish ourselves. It is, therefore, a vital value which enables our organic body, by means of the processes of internal combustion, to maintain its temperature and, in general, to preserve the functioning of its metabolism. Yet, we may eat together with one other person or many others. Thus, the act of eating is more than vital, because it is tinged by an aspect of meeting others that places it in the domain of shared intersubjectivity. During this encounter I may discuss working matters, analyse or assess with my colleagues projects pertaining to professional life. The value of meeting is interwoven with the vital value of taking in food. I may select a pleasant restaurant or, if I am at home, a beautiful table. The aesthetic value of the ambience or atmosphere is grafted onto the value of meeting to enrich it without robbing it of its character. When, on the other hand, the meeting units friends or relatives who rejoice together, the aesthetic value becomes expressive of a relationship that involves not only the public face we project of our life but also the most intimate part of our personality. It is still a meal that feeds our body, but this process bears no comparison with the acquisition of food through hunting, or with the struggle for physical survival that drives the great animal predators. Moreover, if during this friendly or family meeting the conversation among the "partakers" becomes an interesting discussion that enriches the way we understand life, the meal attains a truly spiritual dimension.
Thus, we may have several levels of understanding the same action (the meal), which are not mutually exclusive, yet are not of equal footing. The levels just mentioned correspond to kinds of life: biological life, social life [vida de relação], aesthetic life, spiritual life. Not all partakers of the meal are necessarily on the same wavelength. Keeping to the example of the meal, one person may be almost indifferent to the aesthetic aspects dedicated to an atmosphere conducive to conviviality. From another perspective, the more comprehensive values confer richer meaning upon the values involved or take away from them the possibility of this meaning. Thus, if I am in a situation of serious conflict with my relatives, the meal, regardless of its culinary quality and the aesthetic harmony of the atmosphere, loses the sense of a positive intersubjective encounter. Still, what has been termed comprehensive values may take on, without replacing, the values involved. For example, if I am dying of thirst in a desert, it will not be the artistic beauty of the proffered cup that gives meaning to the gesture that recomposes me. The interpenetration of the different levels of life is always present and, therefore, so is the reciprocal involvement of the values.
It is good, nevertheless, to distinguish the plane of concrete living from the plane of theory making. In almost spontaneous fashion, or based on a scarcely reflected intuition, every person builds its own hierarchy of values. This shows in the answer to the question, "What matters most to me in this act?" The weight of the circumstances under which action is pondered inevitably affects the spontaneous hierarchical ordering, so that this concrete hierarchical ordering still does not signify an explicit stand on the hierarchy of the levels of life.
Two conclusions stand out from the concept of the hierarchical ordering of values. Before all else, it is not possible to do without it, for it is always present upstream and downstream of our concrete acts. Yet, the concrete and spontaneous character of this presence makes it possible that it will appear in an implicit manner, subconsciously marked by the context of the action. The hierarchical ordering operated by theoretical ethics is quite another thing. This reflects an ideal model, which supposes that each level of life will produce the due response; in the example of the meal, eating satisfies hunger, the intersubjective presence breaks physical solitude, the harmonious or beautiful surroundings will meet our aesthetic taste, while the interest of the conversation will stimulate our spirit. It is at this point that the theoretical question of the hierarchical ordering of values arises. The highest values will be those whose absence most contributes to divest the meaning of the acts performed. In line with Max Scheler, we might say that cultural, ethical, aesthetic, and religious values are those that possess the virtue of bestowing on our acts the most enduring and deepest meaning, as if the presence of these values had the ability to resist destruction of life. The point is not to comment Scheler’s theses in this regard but to confront them with the questions that human beings, at the turn of a new millennium, are asking themselves. As "the life of living," ethics must be dynamic, not static–it must be steeped in the turbulence of change but, like life, well forth from its organic, unifying centre.

ETHICAL IMAGINATION

In our hierarchical ordering of values, we must establish a connection between the concrete, pre-reflexive character of such values, on the one hand, and their theory, on the other. After all, the private and personal motivation of the acts is what bears the concrete character of hierarchical ordering. "Concrete" and "gratuitous" are not synonyms, however. The mystery of values resides in this subtle articulation. It is true that, in some way, I am the "absolute source" of values, in the sense mentioned above. But I can be a source only when I receive into my consciousness a value that I recognize as "able to motivate me." Now, not all the values that can rouse my motivation do so for the same reasons. Therefore, Max Scheler is right in discerning intrinsic differences among values and the superiority of some over others. What criteria might attest such superiority? Perhaps the most general and appropriate criterion is the capacity of a certain value to open my existence to that of others through a common relation to a content–a value content–that unites us by virtue of its shared "meaning." We say of such values that they are "spiritual" because they are distinguished by their power to unite what has been dispersed: individualised human bodies or isolated minds. Even in the pre-religious meaning of the word, we might say that the spirit of the human being is constitutionally a "communion," inasmuch as it makes unity possible where pure diversity reigns.
But how can this task be accomplished in concrete terms? To answer, we must invoke ethical imagination. The domain of this imagination is coextensive with that of "practical wisdom," which does not entail that it is redirected to the free will of each individual. Ethical imagination underlies ethical creativity. The first part of this analysis suggests, therefore, that we take up again the challenges we confronted once, to filter them through the prism of ethical imagination.
Against the objectification of the human being, and against the multiple forms of the instrumentalisation of the human being, we have the possibility today of inventing attitudes that manifest how ethics is possible, real and necessary. Ethics exists, despite and within the conditioning limits of human beings. Then, motivation no longer appears as a "given," as a fact for action; it is sought, it is wanted: "I want to motivate myself for a certain behaviour" which is attainable to my ethically free action. "I am capable of motivating myself and of being motivated," is the first gesture of ethical liberation. Today, it constitutes a true challenge or true ethical call to the person. Paradoxically, the oft repeated question, "What values might motivate young people today?" is to be answered at once: What motivates is the actual act of being motivated, the will to resist the incapacity to be motivated by anything at all.
Today’s world might not contain more contradictions than the old; it is our awareness of those contradictions that has become wider and deeper. Because imagination has never been purely rational, it is especially endowed with an exploratory function: In the midst of contradictions, it has the ability to trace a course that is neither alibi nor a simple eclectic alternative. Navigating between the security of dominating reason and the insecurity of endemic violence, the ethical imagination will have to invent a motivating course.
In similar fashion, the implacable logic of profit, ignoring people and manipulating public opinion, presides over globalisation and constitutes a risk to the "humanity" of the human being. Yet, at the same time, human rights have never been stressed so strongly–here is a new contradiction that the ethical imagination will have to "manage" on a global level. It is not a matter of fighting globalisation, but of inventing new ways to respect persons, especially concerning their particular traits and areas of fragility.
The relationship, otherwise indispensable in itself, of being and appearance takes on, in our image society the form of an opposition and, not seldom, that of a contradiction. The ethical imagination will not respond to this merely by beating back into the refuge of a hypothetical inner purity; instead, it will discover a course that chooses between a right relation or a perverted relation, between the two inescapable facets of existence: authenticity or ethical duplicity.
The instability that affects the human being whose life unfolds in time may be equally–we might say, eminently–the domain of the ethical imagination. What is at stake is not only the ontological, but also the ethical relationship of the human being with time. The ethical imagination is able to discover the permanence of values behind the mutability of their forms of expression; that is, it is able to project ethical coherence into the person’s experience. When all is said and done, might not the new outlook on life that the millennium expects from ethics be the discovery of a new ethical coherence?


The Catholic University of Portugal
Portugal


sábado, janeiro 22, 2005

Alicerçando Fotos # 7 - Misha Gordin



Misha Gordin

sexta-feira, janeiro 21, 2005

Alicerçando Palavras # 35 - Bernard-Henri Lévy sobre Sartre


Drogue enconre. La vraie drogue de Sartre ce n'est ni la mescaline ni la corydrane, c'est l'écriture.Shooté à l'écriture. Drogué à la littérature. Et le Castor dans le rôle du dealer qui, pendant la guerre, lui fournit, à Brumath, en Alsace, au besoin en venant elle-même, sa dose d'encre, de carnets, de livres, de papier. Il ne lit pas, il écrit. Il n'écrit pas un peu, il écrit tout le temps. Cette main folle, comme on dit d'une patte folle. Cette main qui court sur la feuille, qui galope, qui ne s'arrête jamais
a l'effet produit ou à la formule. "Il n'était plus qu'une main qui écrit", disait Mauriac du dernier Proust. De même Sartre racontant dans Les Mots, comment sa plume va parfois "si vite", qu'il en a "mal au poignet" et retrouvant donc, là aussi, contre toute attente, le geste de la folie-Proust. Cette compulsion. Cette possession. Cette écriture machinique, donc machinale, sans maîtrise, à plume abattue, presque obscène. Cette fuite en avant qui fait de l'écriture une pratique étrange, étrangère, à la limite du propre, loin de toute identité. Et puis l'impression, au bout d'un moment, par le seule travail de la main, par la seule puissance des mots frottés aux autres mots, de voir les images frémir, bouillir, entrer en surfusion, s'assembler. L'écriture comme une névrose? Sartre dira cela. Il dira: une "maladie". Ou des "hernies". Ou un "cancer généralisé". Et ce sera même, on le verra, le thème principal des Mots. Mais ce qu'il dit déjà, ce qu'il a toujours dit et qu'il réprésentera julqu'à la fin, c'est que l'écriture est une drogue. Une vraie drogue. Une auto-intoxication permanente de l'écrivain par lui-même et de la litérature par ses propres charmes et toxines. Tous les écrivains savent cela. Tous les fous de mots ont l'expérience de cette polymérisation des mots par les mots. Zéro mots tant que je suis em régine normal. Non pas: "moins" de mots, mais "zéro", vraiment "zéro" - les mots qui se consument, la phrase qui ne prend pas, s'étiole, se défait, refroidit et puis, tout à coup, quand le vide s'est fait autour des mots, quand il ne reste plus qu'eux, les mots, dans le vide de l'âme centrifuguée, quand se sont créées, autrement dit, les conditions de la surchauffe, les syllabes qui coagulent, la phrase qui lève et prend forme, tout l'imaginaire de l'écrivain qui entre en ebullition - l'exacte descritption de l'effet, dans une âme, des amphétamines et de la drogue. Sartre, dans son entretien avec Sicard: "c'est très rare que j'aie pensé pour écrire; je me mets au travail; et, en même temps que j'écris, j'analyse, je raffine, rendant l'idée plus nette ou plus rationnelle" et, plus loin: "l'inspiration n'est pas une idée qui naît brusquement dans la conscience et se développe; elle est au bout de la plume; je ne fais pas de différence entre inventer le détail et écrire, ça n'est même pas chronologiquement différent". Donc, les mots. L'écriture comme une raffinerie de mots. Le souci maniaque, obstiné, de la quantité de mots raffinés, cette drogue. Baudelaire: "il faut être toujours ivre, tout est là, c'est l'unique question". Ivre de quoi? "De vin", si vous voulez. Ou de corydrane. Mais aussi, "à votre guise", de "vertu" ou de "poésie". La ligne-Sartre.


In, Le Siècle de Sartre, Bernard-Henri Lévy, Grasset, Paris, 2000


quinta-feira, janeiro 20, 2005

Alicerçando Poesia # 45 - Anrique de Mota



Gram trabalho é viver

Pois nam s' escusa perder
a vida com grande afronta
lançando bem esta conta
gran trabalho é viver


és vida tam estimada
quanto são breves teus dias
que sendo por sempre dada
quanto és agora amada
tam desamada serias.
e pois nunca dás prazer
que nam venha com afronta
lançando bem esta conta
gram trabalho é viver



Outra grosa em vilancete


quem nesta vida cuidar
pode bem certo saber
qu'é gram trabalho viver


quem cuidar nesta mudança
q'este triste mundo faz
achará que nele jaz
a maior desconfiança.
e pois nunca dá bonança
sem temor de se perder
gram trabalho é viver


cada um em seu estado
meta bem a mão no seo
achará segundo creo
muito amor muito cuidado.
e pois ante de ganhado
este bem s'há-de perder
gram trabalho é viver


estes bens de tanta briga
com fadiga são havidos
com fadigas possuídos
e leixados com fadiga.
e pois este mal sojiga
no ganhar e no poder
gram trabalho é viver


logo m'eu contentaria
se nesta vida presente
alguém vivesse contente
ou descansado um só dia.
mas porqu'isto qu'eu queria
nunca foi nem há de ser
gram trabalho é viver



in Obras de Anrique de Mota. Edição de Osório Mateus, Comissão Nacional Para as Comemorações dos Descobrimentos Portugueses, 1999





quarta-feira, janeiro 19, 2005

Alicerçando fotos # 6


Viagens na minha terra - Alentejo.


Coisas nossas Posted by Hello

terça-feira, janeiro 18, 2005

Alicerçando Imagens # 27 - Il'ya Repin - Rússia - 1844/1930



Il'ya Repin - Retrato de Anton Rubinstein, 1881, óleo sobre tela, Galeria Tretyakov, Moscovo

segunda-feira, janeiro 17, 2005

Alicerçando Poesia # 44 - Ted Hughes (1930-1998)


VENTO

A casa esteve toda a noite lá longe, no mar,
o bosque quebrando entre a escuridão, os montes troando,
o vento fustigando os campos sob as janelas,
também ele escuro nos seus volteios, cego e molhado,

até ao nascer do dia. Então, sob um céu alaranjado,
viam-se nesses montes lugares novos, o vento trazia
uma luz cortante, luminosidade negra e esmeralda
a ondular como se vista pelas lentes de uns olhos loucos.

Pelo meio-dia trepei por uma das paredes da casa
até à porta do depósito de carvão. Ousei olhar mais para cima:
por entre a força do vento que amolgava os meus olhos
os montes pareciam tendas a ressoar, retesadas nas cordas,

os campos estremeciam e via-se um esgar na linha do horizonte,
na iminência de rebentar e desaparecer com mais uma chicotada:
o vento arrancava dali uma pega e um alcatraz
de cauda preta a dobrar-se devagar como uma barra de ferro. A casa

retinia como se fosse uma fina taça verde prestes
a estilhaçar-se a qualquer momento. Enfiados
nas cadeiras frente ao lume, aperta-se-nos
o coração e não há livro ou pensamento que nos distraia nem somos

capazes de nos distrair uns com os Outros. Olhamos o fogo a arder
e sentimos tremer os alicerces da casa, mas permanecemos sentados
vendo a janela a abanar, quase a cair para dentro,
ouvindo o grito das pedras sob o horizonte.



O Fazer da Poesia
tradução de Helder Moura Pereira


domingo, janeiro 16, 2005

Alicerçando Palavras # 34 - Theodor W. Adorno


Theodor W. Adorno


The writer is in a permanent predicament when it comes to punctuation marks; if one were fully aware while writing, one would sense the impossibility of ever using a mark of punctuation correctly and would give up writing altogether. For the requirements of the rules of punctuation and those of the subjective need for logic and expression are not compatible: in punctuation marks the check the writer draws on language is refused payment. The writer cannot trust in the rules which are often rigid and crude; nor can he ignore them without indulging in a kind of eccentricity and doing harm to their nature by calling attention to what is inconspicuous – and inconspicuousness is what punctuation lives by. But if, on the other hand, he is serious, he may not sacrifice any part of his aim to a universal, for no writer today can completely identify with anything universal; he does so only at the price of affecting the archaic. The conflict must be endured each time, and one needs either a lot of strength or a lot of stupidity not to lose heart. At best one can advise that punctuation marks be handled the way musicians handle forbidden chord progressions and incorrect voice leading. With every act of punctuation, like every musical cadence, one can tell whether there is an intention or whether it is pure sloppiness.


Theodor W. Adorno, Notes to Literature, Volume 1.ed. Rolf Tiedemann and trans. Shierry Weber Nicholson. Columbia University Press. 1958. pp. 96-7



sábado, janeiro 15, 2005

Alicerçando Poesia # 43 - Pablo Neruda


Dafni Amecke Tzitzivakos


Dai a mim os verdes
labirintos,
as esbeltas
vertentes
dos Andes, e sob as parreiras,
amada, tua cintura
de guitarra!

Dai-me as ondas
que sacodem
o corpo cristalino
de minha pátria,
deixai-me ao Este ver como se eleva
a majestade do mundo
num colar altivo de vulcões
e a meus pés só o selo
da espuma,
neve do mar, eterna prataria!

Amor dos meus amores,
terra pura,
quando voltares
irei correndo à tua proa
de embarcação terrestre,
e assim navegaremos
confundidos
até que tu me cubras
e eu possa contigo, eternamente,
ser vinho que regressa em cada Outono,
pedra de tuas alturas,
onda de teu marinho movimento!


Pablo Neruda, Tercer libro de las odas




sexta-feira, janeiro 14, 2005

Alicerçando Fotos # 5 - Lois Greenfield



Lois Greenfield

quinta-feira, janeiro 13, 2005

Alicerçando Palavras # 33 - Marc Jimenez


L’Enjeu des Ruptures


Définir les ruptures qui surviennent au XIXème siècle comme des refus plus ou moins brusques de la tradition est certes insuffisant. Il serait facile d’objecter que l’histoire en général et l’évolution de l’art en particulier ne sont qu’une succession, à intervalles plus ou moins longs, de sursauts, d’à-coups, de mutations, et parfois d’oppositions plus ou moins radicales aux époques antérieures. En ce sens, chaque époque s’invente une modernité en imaginant un futur susceptible de l’affranchir de la routine et de la libérer du poids des temps présents.

Platon, au IVème siècle avant notre ère, réagit en « antimoderne » vis-à-vis des innovations artistiques suggérées par certains sophistes. Sa réaction « conservatrice » prouve, par là même, l’existence d’un désir de changement qui trouve son expression dans la philosophie d’Aristote, après que celui-ci s’est séparé de l’Académie. La Renaissance marque une rupture décisive avec le prétendu « obscurantisme » du Moyen Age ; le cartésianisme rompt avec l’héritage scolastique avant que le rationalisme des Lumières ne combatte la raison classique et absolutiste ; rationalisme lui-même emporté par la bourrasque romantique. En ce sens, la querelle des « anciens » et des « modernes » a toujours sévi et la « modernité » - ou quel que soit son nom – a toujours eu ses défenseurs acharnés et ses détracteurs résolus.

Qu’est-ce qui permet de considérer la modernité, telle que la définit Baudelaire, comme annonciatrice de changements plus profonds que les précédents ? En quoi l’impressionnisme, né peu après la mort de l’auteur des Fleurs du Mal, peut-il être perçu
comme um bouleversement d’importance au moins égale à celui de la Renaissance dans l’histoire de l’art occidental ?

Certes, les dieux antiques, les saints et les apôtres chrétiens désertent les arts plastiques ; ils sont remplacés par des thèmes mettant en valeur le côté « épique » de la vie contemporaine, selon l’expression de Baudelaire. Pour le dire brièvement, le contenu de l’art, les idées représentées changent et puisent dans l’actualité. Mais plus que la nouveauté thématique, c’est surtout la forme de cette représentation qui heurte l’académisme, déconcerte la critique et choque le public. Seule une minorité d’amateurs se risquent à prendre parti pour les novateurs. Souvenons-nous de l’Olympia de Manet. Bien peu célèbrent la posture plutôt chaste et « les formes joviales de cette petite femme blanche » ; ce n’est pas la nudité en tant que telle qui pousse le public à hurler au scandale mais, comme dans Le déjeuner sur l’herbe, la manière non conventionnelle dont Manet traite le contour et le modelé d’un corps sans hiérarchie de valeurs. « Quoi de plus naïf ? » demande pourtant « naïvement » le peintre ; mais les critiques ne l’entendent pas de cette oreille et leur hargne contraste avec l’innocence de la belle indifférente au regard absent : « odalisque au ventre jaune, ramassée on ne sait où », « gorile femelle », telles sont les gracieusetés qui accueillent cette « vierge sale » et « faisandée ».

Le plus remarquable est la distorsion entre les intentions des peintres, rarement animés de mauvaises intentions, et le déchaînement des spectateurs. Les peintres ne recherchent pas sciemment le scandale ; il constatent le plus souvent que leurs oeuvres font scandale. Tel est le cas de Manet, d’éducation et de sensibilité bourgeoises, qui brigue la Légion d’honneur et L’Institut et s’abstient prudemment d’exposer ses toiles avec celles des impressionistes. Degas incarne également cette contradiction apparamment étonnante, et fréquente chez les premiers peintres de la modernité, entre le statut social, le souci de reconnaissance publique, et le tollé que provoquent leurs oeuvres. On peut être bourgeois, pudibond et néanmoins moderne. Ce qui choque les contemporains chez Degas, notamment dans les scènes intimistes montrant les femmes à leur toilette, ce ne sont pas les promesses de nudité, mais la posture du voyeur dans laquelle il installe le spectateur, invité à regarder par le trou de la serrure, non pas – comme le dit Degas lui-même – pour voir des « Suzannes au bain » mais simplement des « femmes au tub », Problème de forme donc, et non pas de contenu. Question de conventions ici refusées au profit d’un dispositif visuel qui donne l’impression d’être témoin, comme par inadvertance, d’une scène osée, prise sur le vif.

L’impressionisme confirme la tendance aux investigations formelles en ouvrant la voie à des explorations sustématiques et bientôt parfaitement programmées sur la force subversive des formes inédites ; un nouveau mode de représentation se met em place, capable d’ébranler les anciens dogmes et de dénoncer l’esthétisme de l’art pour l’art, plus sûrement encore que le réalisme puissant et généreux d’un Courbet, trop rapidement récupéré par l’académisme et le conformisme ambiants. L’hostilité du grand public et de nombreux critiques envers les formes nouvelles est là pour prouver que toucher à la forme c’est libérer une puissance subversive qui déborde le domaine artistique ; renoncer à la mimésis, au sacro-saint principe d’imitation solidement établi depuis quatre siècles, revient à saper les valeurs fondatrices de la mrale et de la politique dans une société confiante en son ordre établi.



Qu’est-ce que l’esthétique?, Marc Jimenez, Gallimard, 1977



quarta-feira, janeiro 12, 2005

Alicerçando Poesia # 42 - António Maria Lisboa (1928-1953)


H

Sei que dez anos nos separam de pedras
e raízes nos ouvidos

e ver-te, ó menina do quarto vermelho,
era ver a tua bondade, o teu olhar terno
de Borboleta no Infinito

e toda essa sucessão de pontos vermelhos no espaço
em que tu eras uma estrela que caiu
e incendiou a terra´

lá longe numa fonte cheia de fogos-fátuos.

In, Poesia

terça-feira, janeiro 11, 2005

Alicerçando Imagens # 26 - Paul Delvaux - 1897-1994



Nuit sur la mer, 1976


segunda-feira, janeiro 10, 2005

Alicerçando Poesia # 41 - Paulo Leminski (1944-1989)



A estrela cadente
me caiu
ainda quente
na palma da mão

************

Escrevo. E pronto
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
e as estrelas lá no céu,
lembram letras no papel,
quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas

************

um bom poema
leva anos
cinco jogando bola,
mais cinco estudando sânscrito,
seis carregando pedra,
nove namorando a vizinha,
sete levando porrada,
quatro andando sozinho,
três mudando de cidade,
dez trocando de assunto,
uma eternidade, eu e você,
caminhando junto


************


esta vida é uma viagem
pena eu estar
só de passagem

************

Acordei bemol

acordei bemol
tudo estava sustenido

sol fazia
só não fazia sentido

******************

Eu
Paulo Leminski


eu
quando olho nos olhos
sei quando uma pessoa
está por dentro
ou está por fora
quem está por fora
não segura
um olhar que demora
de dentro de meu centro
este poema me olha


**********************


parem
eu confesso
sou poeta

cada manhã que nasce
me nasce
uma rosa na face

parem
eu confesso
sou poeta

só meu amor é meu deus

eu sou o seu profeta


**********


primeiro frio do ano
fui feliz
se não me engano


*****************


a vida varia
o que valia menos
passa a valer mais
quando desvaria


*******************


Confira
tudo que respira
conspira


********************


Viver de noite me fez senhor do fogo.
A vocês eu deixo o sono.
O sonho, não.
Esse eu mesmo carrego

******************


Sossegue Coração

ainda não é agora
a confusão prossegue
sonhos afora

calma calma
logo mais a gente goza
perto do osso
a carne é mais gostosa


********************


quando chove,
eu chovo,
faz sol,
eu faço,
de noite
anoiteço,
tem deus,
eu rezo,
não tem,
esqueço,
chove de novo,
de novo, chovo,
assobio no vento,
daqui me vejo,
lá vou eu,
gesto no movimento


*********************


Poemetos

II

Vim pelo caminho difícil,
a linha que nunca termina
a linha bate na pedra,
a palavra quebra uma esquina
mínima linha vazia,
a linha, uma vida inteira,
palavra, palavra minha.

III

O pauloleminski
é um cachorro louco
que deve ser morto
a pau a pedra
a fogo a pique
senão é bem capaz
o filhodaputa
de fazer chover
em nosso piquenique

V

apagar-me
diluir-me
desmanchar-me
até que depois
de mim
de nós
de tudo
não reste mais
que o charme

VI

uma carta uma brasa através
por dentro do texto
nuvem cheia da minha chuva
cruza o deserto por mim
a montanha caminha
o mar entre os dois
uma sílaba um soluço
um sim um não um ai
sinais dizendo nós
quando não estamos mais

IX

nem toda hora
é obra
nem toda obra
é prima
algumas são mães
outras irmãs
algumas
clima


**********************


parada cardíaca

essa minha secura
essa falta de sentimento
não tem ninguém que segure
vem de dentro


vem da zona escura
donde vem o que sinto
sinto muito
sentir é muito lento


********************


Incenso Fosse Música

isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além

domingo, janeiro 09, 2005

Alicerçando Palavras # 32 - Susan Sontag


If literature has engages me as a project, first as a reader and then as a writer, it is an extension of my sympathies to other selves, other domains, other dreams, other words, other territories.

Susan Sontag




Algumas entrevistas com Susan Sontag

Boston Review

Abc.net

iVillage

sábado, janeiro 08, 2005

Alicerçando Palavras # 31 - José Saramago sobre Susan Sontag


Vivo numa cultura que se nega a dar relevo à inteligência. Para mim, a inteligência que merece a pena defender é a que se mostra crítica, dialéctica, céptica e complexa.

Susan Sontag






Dançava com Lobos

Não voltaremos a ver a madeixa branca de Susan Sontag, não ouviremos nunca mais a sua voz forte e ao mesmo tempo aveludada, não encontraremos nos jornais os seus artigos de análise, crítica e também de protesto e indignação, assegurando-nos de que a honradez intelectual continuava, obstinadamente, a não ser uma mera conjunção de vocábulos. Agora os Estados Unidos deveriam estar de luto, se o luto cívico fosse, hoje, nesse país, compatível com a atmosfera perversa e rarefeita que o poder dá a respirar à mentalidade dos seus cidadãos. Susan Sontag "dançava com lobos", ela mesmo era uma loba, e às vezes uivava de desespero porque a dor não acaba no mundo, porque a guerra não acaba no mundo, porque o humano tarda a chegar e o inumano nos vai calcando aos pés todos os dias e em todos os lugares. Adeus, Susan, não voltaremos a ver-nos. Vou sentir a tua falta, asseguro-te. Tu já és, segundo o lugar-comum, uma "perda irreparável". Amanhã começaremos a saber até que ponto.

José Saramago - In, JL, nº 894


sexta-feira, janeiro 07, 2005

Alicerçando Palavras # 30 - Cultura Árabe (Alcorão)


CRIAÇÃO DO HOMEM

Criámos o homem a partir de um punhado de barro, e depois colocámo-lo, como uma gota, num receptáculo seguro. Depois, criámos da gota um coágulo e, deste, um tecido. Do tecido nós fizemos os ossos e depois envolvemo-lo em carne; a partir daí criámo-lo como uma outra criatura. Pois abençoado seja Deus, o mais justo dos criadores.



tradução de: Manuel João Magalhães
Rosa do Mundo - 2001 Poemas para o Futuro, Assírio & Alvim.

quinta-feira, janeiro 06, 2005

Alicerçando Poesia # 40 - José Gomes Ferreira


(Descoberta da "outra" matemática.)

Ai o ponteiro da tortura
naquela sala
que a matemática tornava mais escura
em vez de iluminá-la.

Felizmente só o nada-de-mim ficava lá dentro.

O resto corria no pátio-em-que-nos-sonhamos,
pássaro a aprender os cálculos do vento
aos saltos do chão para os ramos.

Mas só quando voltava para casa à tardinha
encontrava a minha verdadeira matemática à espera
na lógica dura das teclas do piano,
no perfil-oiro-pedra da vizinha,
na flauta de água macia do tanque.
- chuva de Mozart nos zincos da Primavera...

Matemática cantante

(1957-58)

terça-feira, janeiro 04, 2005

Alicerçando Palavras # 29 - Augusto Abelaira



- Tenho uma turma difícil. – Maria José, depois do jantar, admirada subitamente por nunca lhe haver falado nisto. Arriscando: - É estranho que eu esteja quase a meio do ano e que... – Não se atreve a encarar o marido, não se atreve mesmo a terminar a frase.

Embora com a atenção distante, ele compreendeu. Mas receia a conversa, o cansaço do diálogo, a obrigação de se fingir atento, encontrando as palavras necessárias – amanhã começará a conversar com a Zé, a conversar como conversa com toda a gente, a conversar como só com ela não é capaz. Mas desde quando reduziu ao mínimo esses diálogos? A menos que seja isto: as mulheres não são para se falar com elas, são apenas para ir para a cama, são apenas para se lhes falar quando ainda se não foi com elas para a cama.

Maria José (mulher, portanto simplesmente destinada à cama?):

- Sabes o que isso significa? – Calou-se. “Que entre nós não há intimidade. Mas como ele pareça espantado (dir-se-ia que não esteve a ouvir), regressa de novo ao porto inicial. – Que achas? De resto, os outros professores não se queixam, sinto-me envergonhada. No ano passado, nunca to disse?, puseram-me um gafanhoto na sala.

- Podia ter entrado pela janela... – Esta mulher alta e loiro com quem muitos anos antes conversou cheio de felicidade, que veste uma camisola azul-escura de lã, que tantas vezes lhe esteve nos braços (nua e nessa semiconsciência em que se afundam os corpos nus ao fim de alguns momentos de luta), é professora, ensina inglês e alemão no liceu. Certo dia há-de sentar-se (se é que já não se sentou) mais distraidamente, os alunos observar-lhe-ão as pernas nem muito brancas, nem muito morenas, e com uma cicatriz no joelho (não darão pela cicatriz, consequência de uma queda de biciclete – só os dedos do Osório a conhecem), pensarão e dirão coisas obscenas. Osório lembra-se de uma professora – já lhe perdeu o nome – que, enquanto explicava a lição, tinha o hábito de se encostar, e de frente, aos cantos das carteiras. Certo dia, Osório pintou-os a todos com giz; como de costume, ela encostou-se, e quando se afastou tinha uma grande aranha branca na saia, um palmo abaixo da fivela vermelha do cinto.

- Ataram-lhe uma linha às patas. Pus ao acaso um dos rapazes na rua. Ao acaso como faziam os nazis com os reféns.

- Nunca fui professor, que queres que te diga? – Para mais, ainda conservava dos velhos tempos do liceu um ódio quase mortal, e sob muitos aspectos injusto, pelos professores sobretudo pelas professoras.

- Sabes a razão porque chamo e estendo um aluno ao acaso? Porque creio na consciência deles...

Repara melhor na camisola da Maria José. Azul-escura, ficando-lhe muito bem. Como nunca lha tivesse visto, esteve quase a perguntar se era nova, mas receou (não seria a primeira vez) ouvir esta resposta: “É velha, tu é que nunca deste por ela, nunca dás por mim. Estou farta de a pôr”. Poderia até mostrar-lhe um cotovelo meio roto.

- Sentem-se responsáveis quando um colega é injustamente castigado e portam-se menos mal enquanto se lembram. Não é criminoso abusar da consciência de quem a tem? Endireita a gravata! – diz, interrompendo-se. E depois, como se estivesse anonimamente ao telefone, ameaçadora: - Sempre vamos ao cinema? Arranjo-me num instante...

(Março 1965)


Augusto Abelaira, Enseada Amena, Livraria Bertrand, Lisboa, 1966



segunda-feira, janeiro 03, 2005

Alicerçando Imagens # 25 - Rauschenberg



Rauschenberg, Umbrellas,1983 Posted by Hello

domingo, janeiro 02, 2005

Alicerçando Poesia # 39 - Affonso Romano de Sant'Anna


Leitura Natural

Tendo lido os jornais
- infectado a mente, enauseado os olhos -
descubro, lá fora, o azul do mar
e o verde repousante que começa nas samambaias da sala
e recrudesce nas montanhas.

Para que perco tantas horas do dia
nessas leituras necessárias e escarninhas?
Mais valeria, talvez, nas verdes folhas, ler
o que a vida anuncia.

Mas vivo numa época informada e pervertida.
Leio a vida que me imprimem
e só depois
o verde texto que me exprime.