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segunda-feira, outubro 30, 2006

Alicerçando Palavras # 118 - Mia Coto


Perguntas à Língua Portuguesa

Venho brincar aqui no Português, a língua. Não aquela que outros embandeiram. Mas a língua nossa, essa que dá gosto a gente namorar e que nos faz a nós, moçambicanos, ficarmos mais Moçambique. Que outros pretendam cavalgar o assunto para fins de cadeira e poleiro pouco me acarreta.

A língua que eu quero é essa que perde função e se torna carícia. O que me apronta é o simples gosto da palavra, o mesmo que a asa sente aquando o vôo. Meu desejo é desalisar a linguagem, colocando nela as quantas dimensões da Vida. E quantas são? Se a Vida tem, é idimensões? Assim, embarco nesse gozo de ver como a escrita e o mundo mutuamente se desobedecem.

Meu anjo da guarda, felizmente, nunca me guardou.

Uns nos acalentam: que nós estamos a sustentar maiores territórios da lusofonia. Nós estamos simplesmente ocupados a sermos. Outros nos acusam: nós estamos a desgastar a língua. Nos falta domínio, carecemos de técnica.

Ora qual é a nossa elegância? Nenhuma, excepto a de irmos ajeitando o pé a um novo chão. Ou estaremos convidando o chão ao molde do pé? Questões que dariam para muita conferência, papelosas comunicações. Mas nós, aqui na mais meridional esquina do Sul, estamos exercendo é a ciência de sobreviver. Nós estamos deitando molho sobre pouca farinha a ver se o milagre dos pães se repete na periferia do mundo, neste sulburbio.

No enquanto, defendemos o direito de não saber, o gosto de saborear ignorâncias. Entretanto, vamos criando uma língua apta para o futuro, veloz como a palmeira, que dança todas as brisas sem deslocar seu chão. Língua artesanal, plástica, fugidia a gramáticas.

Esta obra de reinvenção não é operação exclusiva dos escritores e linguistas. Recriamos a língua na medida em que somos capazes de produzir um pensamento novo, um pensamento nosso. O idioma, afinal, o que é senão o ovo das galinhas de ouro?

Estamos, sim, amando o indomesticável, aderindo ao invisível, procurando os outros tempos deste tempo. Precisamos, sim, de senso incomum. Pois, das leis da língua, alguém sabe as certezas delas? Ponho as minhas irreticências. Veja-se, num sumário exemplo, perguntas que se podem colocar à língua:

Se pode dizer de um careca que tenha couro cabeludo?

No caso de alguém dormir com homem de raça branca é então que se aplica a expressão: passar a noite em branco?

A diferença entre um às no volante ou um asno volante é apenas de ordem fonética?

O mato desconhecido é que é o anonimato?

O pequeno viaduto é um abreviaduto?

Como é que o mecânico faz amor? Mecanicamente?

Quem vive numa encruzilhada é um encruzilheu?

Se diz do brado de bicho que não dispõe de vértebras: o invertebrado?

Tristeza do boi vem dele não se lembrar que bicho foi na última reencarnação. Pois se ele, em anterior vida, beneficiou de chifre o que está ocorrendo não é uma reencornação?

O elefante que nunca viu mar, sempre vivendo no rio: devia ter marfim ou riofim?

Onde se esgotou a água se deve dizer: "aquabou"?

Não tendo sucedido em Maio mas em Março o que ele teve foi um desmaio ou um desmarço?

Quando a paisagem é de admirar constrói-se um admiradouro?

Mulher desdentada pode usar fio dental?

A cascavel a quem saiu a casca fica só uma vel?

As reservas de dinheiro são sempre finas. Será daí que vem o nome: "finanças"?

Um tufão pequeno: um tufinho?

O cavalo duplamente linchado é aquele que relincha?

Em águas doces alguém se pode salpicar?

Adulto pratica adultério. E um menor: será que pratica minoritério?

Um viciado no jogo de bilhar pode contrair bilharziose?

Um gordo, tipo barril, é um barrilgudo?

Borboleta que insiste em ser ninfa: é ela a tal ninfomaníaca?

Brincadeiras, brincriações. E é coisa que não se termina. Lembro a camponesa da Zambézia. Eu falo português corta-mato, dizia. Sim, isso que ela fazia é, afinal, trabalho de todos nós. Colocamos essoutro português - o nosso português - na travessia dos matos, fizemos que ele se descalçasse pelos atalhos da savana.

Nesse caminho lhe fomos somando colorações. Devolvemos cores que dela haviam sido desbotadas - o racionalismo trabalha que nem lixívia. Urge ainda adicionar-lhe músicas e enfeites, somar-lhe o volume da superstição e a graça da dança. É urgente recuperar brilhos antigos. Devolver a estrela ao planeta dormente.

11/04/1997


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sexta-feira, outubro 27, 2006

Alicerçando Imagens # 102 - Eugène Delacroix - 1798/1863



Two Women at the Well, 1832 - aguarela e lápis - 268x189mm - Museu do Louvre, Paris


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quarta-feira, outubro 25, 2006

Alicerçando Palavras # 117


D'abord soumis à la biologie, l'être humain s'est tenu à quatre pattes; ensuite soumis aux Églises, il s'est mis à genoux; puis, soumis aux puissants, il a marché à la guerre; enfin, soumis au divertissement, il se tient sagement assis ou couché devant son téléviseur.


Christophe Lamoure, Petite philosophie de la télévision, éditions Milan, 2006



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sábado, outubro 21, 2006

Alicerçando Músicas # 3


Uma das minhas favoritas. É só clicar para ouvir.



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quinta-feira, outubro 19, 2006

Alicerçando Poesia # 212 - Boris Vian



Cinématographe

Quand j'avais six ans
La première fois
Que papa m'emm'na au cinéma
Moi je trouvais ça
Plus palpitant que n'importe quoi
Y avait sur l'écran
Des drôl's de gars
Des moustachus
Des fiers à bras
Des qui s'entretuent
Chaqu' fois qu'i trouvent
Un cheveu dans l'plat
Un piano jouait des choses d'atmosphère
Guillaum' Tell ou l'grand air du Trouvère
Et tout le public
En frémissant
S'passionnait pour ces braves gens
Ça coûtait pas cher
On en avait pour ses trois francs

Belle, belle, belle, belle, comm' le jour
Blonde, blonde, blonde, blonde, comm' l'amour
Un rêve est passé sur l'écran
Et dans la salle obscurément
Les mains se cherchent, les mains se trouv'nt
Timidement
Gare, gare, gare, gare, la revoilà
Et dans la salle plus d'un coeur bat
La voiture où elle se croit en sûr'té
Vient de s'écraser par terre
Avec un essieu cassé
Le bandit va pouvoir mettr' la main
Sur le fric, c'est tragique
Non d'un chien
C'est fini, tout s'allume
A mercredi prochain

Maintenant ce n'est
Plus mon papa
Qui m'accompagne au cinéma
Car il plante ses choux
Là-bas pas loin de Saint Cucufa
Mais j'ai rencontré
Un Attila
Un moustachu un type comme ça
Il ador' aller le mercredi
Dans les cinémas
Bien sûr c'est dev'nu l'cinémascope
Mais ça r'mue toujours et ça galope
Et ça reste encor' comme autrefois
Rempli d'cov'boill's sans foi ni loi
Et de justiciers qui vienn'nt fourrer
Leur grand pied dans l'plat

Gare, gare, gare, gare, Gary Cooper
S'approche du ravin d'enfer
Fais attention pauvre crétin
Car Alan Ladd n'est pas très loin
A cinq cents mètres il log' un' balle
Dans un croûton d'pain
Gare, gare, gare, gare, pendant c'temps-là
Je sens qui m'serr' dans son grand bras
Le fauteuil où je m'croyais en sûr'té
N'empêche pas cett' brut' d'essayer
De m'embrasser
J'ai pas vu si Gary s'rait gagnant
Mais comm' c'est l'cinéma permanent
Mon chéri rappell' toi on est resté un an
Et on a eu beaucoup d'enfants.


Boris Vian, 1954



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terça-feira, outubro 17, 2006

Alicerçando Poesia # 211 - Alfonsina Storni - Argentina - 1892-1938


Asi



Hice el libro así:
Gimiendo, llorando, soñando, ay de mí.


Mariposa triste, leona cruel,
Di luces y sombra todo en una vez.
Cuando fui leona nunca recordé
Cómo pude un día mariposa ser.
Cuando mariposa jamás me pensé
Que pudiers un día zarpar o morder.


Encogida a ratos y a saltos después
Sangraron mi vida y a sangre maté.
Sé que, ya paloma, pesado ciprés.
O mata florida, lloré y más lloré.
Ya probando sales, ya probando miel,
Los ojos lloraron a más no poder.
Da entonces lo mismo, que lo he visto bien,
Ser rosa o espina, ser néctar o hiel.


Así voy a curvas con mi mala sed
Podando jardines de todo jaez.


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domingo, outubro 15, 2006

Alicerçando Poesia # 210 - Manoel de Barros


O livro sobre nada

Com pedaços de mim eu monto um ser atônito.
Tudo que não invento é falso.
Há muitas maneiras sérias de não dizer nada, mas só a poesia é verdadeira.
Não pode haver ausência de boca nas palavras: nenhuma fique desamparada do ser que a revelou.
É mais fácil fazer da tolice um regalo do que da sensatez.
Sempre que desejo contar alguma coisa, não faço nada; mas se não desejo contar nada, faço poesia.
Melhor jeito que achei para me conhecer foi fazendo o contrário.
A inércia é o meu ato principal.
Há histórias tão verdadeiras que às vezes parece que são inventadas.
O artista é um erro da natureza. Beethoven foi um erro perfeito.
A terapia literária consiste em desarrumar a linguagem a ponto que ela expresse nossos mais fundos desejos.
Quero a palavra que sirva na boca dos passarinhos.
Por pudor sou impuro.
Não preciso do fim para chegar.
De tudo haveria de ficar para nós um sentimento longínquo de coisa esquecida na terra — Como um lápis numa península.
Do lugar onde estou já fui embora.


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quarta-feira, outubro 11, 2006

Alicerçando Palavras - 116


Vejo alguns escritores e artistas completamente convencidos de si próprios, como se estivessem a exercer na vida uma tarefa gloriosa que gravará os seus nomes no tecto do mundo. Vivem tudo aquilo com o garbo que fazia dizer a certos padres e a certos militares que tinham " consciência da missão", Não tenho nada disso nem nada contra, mas às vezes rio-me.

Eu quando penso nisso, só me apetece recordar o Borges: "Temos por futuro o esquecimento!.


António Alçada Baptista - A cor dos dias



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sábado, outubro 07, 2006

Sem Alicerces


Estou sem computador e os alicerces estão parados.

Até breve, assim espero!