#footer { width:660px; clear:both; margin:0 auto; } #footer hr { display:none; } #footer p { margin:0; padding-top:15px; font:78%/1.6em "Trebuchet MS",Trebuchet,Verdana,Sans-serif; text-transform:uppercase; letter-spacing:.1em; }

terça-feira, agosto 31, 2004

ALICERÇANDO IMAGENS #2 - ROTHKO

MARK ROTHKO - 1903/1970



verde sobre morado, 1961 - Museu Thyssen Bornemiza Posted by Hello

sábado, agosto 28, 2004

ALICERÇANDO FOTOS #2

WILLIAM HENRY FOX TALBOT - 1800/1877


William Henry Foz Talbot - one of the greatest figures of the 19th century - mathematician, physicist, classicist, philologist, and transcriber of Syrian and Chaldean cuneiform texts. In late September 1840 he invented the positive/negative process and he is known as the Father of Modern Photography.


FONTE



fern leaf ;Posted by Hello




William Henry Fox Talbot ;Posted by Hello

sexta-feira, agosto 27, 2004

ALICERÇANDO POESIA #4 - WALT WHITMAN


Oh Captain! My Captain!

O Captain! my Captain! our fearful trip is done,
The ship has weather'd every rack, the prize we sought is won,
The port is near, the bells I hear, the people all exulting,
While follow eyes the steady keel, the vessel grim and daring;
But O heart! heart! heart!
O the bleeding drops of red,
Where on the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.


O Captain! my Captain! rise up and hear the bells;
Rise up--for you the flag is flung--for you the bugle trills,
For you bouquets and ribbon'd wreaths--for you the shores a-crowding,
For you they call, the swaying mass, their eager faces turning;
Here Captain! dear father!
This arm beneath your head!
It is some dream that on the deck,
You've fallen cold and dead.


My Captain does not answer, his lips are pale and still,
My father does not feel my arm, he has no pulse nor will,
The ship is anchor'd safe and sound, its voyage closed and done,
From fearful trip the victor ship comes in with object won;
Exult O shores, and ring O bells!
But I with mournful tread,
Walk the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.





Gods


THOUGHT of the Infinite - the All!
Be thou my God.


Lover Divine, and Perfect Comrade!
Waiting, content, invisible yet, but certain,
Be thou my God.


Thou - thou, the Ideal Man!
Fair, able, beautiful, content, and loving,
Complete in Body, and dilate in Spirit,
Be thou my God.


O Death - (for Life has served its turn;)
Opener and usher to the heavenly mansion!
Be thou my God.


Aught, aught, of mightiest, best, I see, conceive, or know,
(To break the stagnant tie - thee, thee to free, O Soul,)
Be thou my God.


Or thee, Old Cause, when - er advancing;
All great Ideas, the races - aspirations,
All that exalts, releases thee, my Soul!
All heroisms, deeds of rapt enthusiasts,
Be ye my Gods!


Or Time and Space!
Or shape of Earth, divine and wondrous!
Or shape in I myself - or some fair shape, I, viewing, worship,
Or lustrous orb of Sun, or star by night:
Be ye my Gods.


Walt Whitman (1819-1892)


quinta-feira, agosto 26, 2004

ALICERÇANDO PALAVRAS #3 - ALÇADA BAPTISTA

Do livro A Pesca à Linha Algumas Memórias de António Alçada Baptista dois excertos das suas PEQUENA HISTÓRIA.


Houve um certo equívoco entre a minha geração e Júlio Dantas, porque, vendo bem, ele não era mau escritor, mas o ter tomado uma posição tão agressiva contra o modernismo – o que deu origem ao Manifesto Anti-Dantas, do Almada – comprometeu-o, a ele e à Academia de que era Presidente perpétuo, no símbolo da antimodernidade para a geração seguinte e para a minha. Como tal entrou no anedotário da vida intelectual portuguesa.

Conta-se que, uma vez, à porta da Brasileira, estava o Santa-Rita Pintor, e o Júlio Dantas encaminhando-se para lá. O Santa-Rita cumprimentou-o assim:

- Como está Senhor Dantas Júlio?

Ele empertigou-se e disse-lhe muito sério:

- O meu nome é Júlio Dantas.

- Sim, mas o senhor está a vir daí para aqui e eu estou a vê-lo daqui para aí.


***


Um amigo, diplomata brasileiro, foi colocado na Embaixada do Brasil na Holanda. Chegou à noite e, logo na manhã seguinte, telefonou para a Embaixada para combinar com o Embaixador a sua apresentação. Atendeu o porteiro, um português imigrado que assegurava a guarda daquela casa.

O diplomata perguntou:

- O Senhor Embaixador esta?

- O Senhor Embaixador não está.

E, como ele sabia somo se compunha o quadro da Embaixada foi perguntando, um por um, pelos vários titulares. Não estava nenhum. Admirado perguntou:

- Então, de manhã não trabalham?

Resposta do porteiro:

- Não. De manhã não vêm. À tarde é que não trabalham.

quarta-feira, agosto 25, 2004

ALICERÇANDO POESIA #3 - CAMÕES


Canção X


Vinde cá, meu tão certo secretário,
Dos queixumes que sempre ando fazendo.
Papel com quem a pena desafogo!
As sem-razões, digamos, que, vivendo,
Me faz o inexorável e contrário
Destino, surdo a lágrimas e a rogo.
Deitemos água pouca em muito fogo;
Acenda-se com gritos um tormento
Que a todas as memórias seja estranho.
Digamos mal tamanho
A Deus, ao mundo, à gente e, enfim, ao vento,
A quem já muitas vezes o contei,
Tanto debalde como o conto agora;
Mas, já que pera errores fui nascido,
Vir este a ser um deles não duvido.
Que pois já de acertar estou tão fora,
Não me culpem também se nisto errei.
Sequer este refúgio só terei..
Falar e errar, sem culpa livremente.
Triste quem de tão pouco está contente!

Já me desenganei que de queixar-me
Não se alcança remédio; mas quem pena
Forçado lhe é gritar, se a dor é grande.
Gritarei; mas é débil e pequena
A voz pera poder desabafar-me,
Porque nem com gritar a dor se abrande.
Quem me dará, sequer, que fora mande
Lágrimas e suspiros infinitos,
Iguais ao mal que dentro na alma mora?
Mas quem pâde aigúa hora
Medir o mal com lágrimas ou gritos?
Enfim, direi aquilo que me ensinam
A ira, a mágoa, e delas a lembrança,
Que é outra dor por si mais dura e firme.
Chegai, desesperados, pera ouvir-rne,
E fujam os que vivem de esperança
Ou aqueles que nela se imaginam,
Porque Amor e Fortuna determinam
De lhe darem poder pera entenderem,
À medida dos males que tiverem.

Quando vim da materna sepultura
De novo ao mundo, logo me fizeram
Estrelas infelizes obrigado;
Com ter livre alvedrio, mo não deram,
Que eu conheci mil vezes na ventura
O milhor, e o pior segui, forçado.
E, pera que o tormento conformado
Me dessem co'a idade, quando abrisse,
Inda menino, os olhos, brandamente,
Mandam que, diligente,
Um Minino sem olhos me ferisse.
As lágrimas da infância já manavam
Com úa saudade namorada;
O som dos gritos que no berço dava,
Já como de suspiros me soava.
Co'a idade o Fado estava concertado;
Porque, quando, por caso, me embalavam,
Se versos de amor tristes me cantavam,
Logo me adormecia a natureza,
Que tão conforme estava co'a tristeza.

Foi minha ama úa fera; que o destino
Não quis que mulher fosse a que tivesse
Tal nome pera mim; nem a haveria.
Assim criado fui, por que bebesse
O veneno amoroso, de minino,
Que na maior idade beberia,
E, por costume, não me mataria.
Logo então vi a imagem e semelhança
Daquela humana fera tão fermosa,
Suave e venenosa,
Que me criou aos peitos da esperança;
De quem eu vi depois o original,
Que de todos os grandes desatinos
Faz a culpa soberba e soberana.
Parece-me que tinha forma humana,
Mas cintilava espíritos divinos.
Um meneio e presença tinha tal,
Que se vangloriava todo o mal
Na vista dela; a sombra, co'a viveza,
Excedia o poder da Natureza.

Que género tão novo de tormento
Teve Amor, que não fosse, não somente
Provado em mim, mas todo executado?
Implacáveis durezas, que o fervente desejo,
Que dá força ao pensamento,
Tinham de seu propósito abalado,
E de se ver, corrido e injuriado;
Aqui, sombras fantásticas, trazidas
De algúas temerárias esperanças;
As bem-aventuranças
Nelas também pintadas e fingidas;
Mas a dor do desprezo recebido,
Que a fantasia me desatinava,
Estes enganos punha em desconcerto;
Aqui, o adevinhar e o ter por certo
Que era verdade quanto adevinhava,
E logo o desdizer-me, de corrido;
dar às cousas que via outro sentido,
E para tudo, enfim, buscar razões;
Mas eram muitas mais as sem-razões".

Não sei como sabia estar roubando
Cos raios as entranhas, que fugiam
Por ela, pelos olhos sutilmente!
Pouco a pouco invenciveis me saíam,
Bem como do véu húmido exalando
Está o sutil humor o Sol ardente.
Enfim, o gesto puro e transparente,
Para quem fica baixo e sem valia
Deste nome de belo e de fermoso;
O doce e piadoso
Mover de olhos, que as almas suspendia
Foram as ervas mágicas, que o Céu
Me fez beber; as quais, por longos anos,
Noutro ser me tiveram transformado,
E tão contente de me ver trocado
Que as mágoas enganava cos enganos;
E diante dos olhos punha o véu
Que me encobrisse o mal, que assi creceu,
Como quem com afagos se criava
Daquele para quem crecido estava.

Pois quem pode pintar a vida ausente,
Com um descontentar-me quanto via,
E aquele estar tão longe donde estava;
O falar, sem saber o que dezia;
Andar, sem ver por onde, e juntamente
Suspirar sem saber que suspirava?
Pois quando aquele mal m'atormentava
E aquela dor que das Tartáreas águas
Saiu ao mundo, e mais que todas doe,
Que tantas vezes soe
Duras iras tornar em brandas mágoas;
Agora, co furor da mágoa irado,
Querer e não querer deixar d'amar,
E mudar noutra parte por vingança
O desejo privado de esperança,
Que tão mal se podia já mudar;
Agora, a saudade do passado
Tormento, puro, doce e magoado,
Fazia converter estes furores
Em magoadas lágrimas de amores?

Que desculpas comigo que buscava
Quando o suave Amor me não sofria
Culpa na causa amada, e tão amada!
Enfim, eram remédios que fingia
O medo do tormento que ensinava
A vida a sustentar-se, de enganado.
Nisto ua parte dela foi passada,
Na qual se tive algum contentamento
Breve, imperfeito, tímido, indecente
Não foi sendo semente
De longo e amaríssimo tormento.
Este curso contino de tristeza,
Estes passos tão vãmente espalhados,
Me foram apagando o ardente gosto
Que tão de siso n'alma tinha posto,
Daqueles pensamentos namorados
Em que eu criei a tenra natureza,
Que ao longo costume da aspereza
Contra quem força humana não resiste,
Se converteu no gosto de ser triste.

Destarte a vida noutra fui trocando;
Eu não, mas o destino fero, irado,
que eu ainda assi por outra não trocara.
Fez-me deixar o pátrio ninho amado,
Passando o longo mar que ameaçando
Tantas vezes me esteve a vida cara.
Agora exprimentando a fúria rara
De Marte, que cos olhos quis que logo
Visse e tocasse o acerbo fruto seu
(E neste escudo meu
A pintura verão do infesto fogo);
Agora, peregrino vogo e errante,
Vendo nações, linguagens e costumes,
Céus vários, qualidades diferentes,
Só por seguir com passos diligentes
A ti, Fortuna injusta, que consumes
As idades, levando-lhe diante
Ua esperança em vista de diamante,
Mas quando das mãos cai se conhece
Que é frágil vidro aquilo que aparece.

A piedade humana me faltava,
a gente amiga já contrária via,
no primeiro perigo; e, no segundo,
terra em pôr os pós me falecia
ar para respirar se me negava,
e faltavam-me, enfim, o tempo e o mundo.
Que segredo tão árduo e tão profundo:
nascer para viver, e para a vida
faltar-me quanto o mundo tem para ela!
E não poder perdê-la,
estando tantas vezes já perdida!
Enfim, não houve transe de fortuna,
nem perigos nem casos duvidosos,
injustiças daqueles, que o confuso
regimento do mundo, antigo abuso,
faz sobre os outros homens poderosos,
que eu não passasse, atado à grã coluna
do sofrimento meu, que a importuna
perseguição de males em pedaços
mil vezes fez, à força de seus braços.

Não conto tantos males como aquele que,
Depois da tormentosa procela,
Os casos dela conta em porto ledo;
Que inda agora a Fortuna flutuosa
A tamanhas misérias me compele,
Que de dar um só passo temho medo.
Já de mal que me venha não me arredo,
Nem bem que me faleça já pretendo,
Que para mim não val astúcia humana;
Da força soberana,
Da Providência, enfim, divina, pendo.
Isto que cuido e veijo, às vezes tomo
Para consolação de tantos danos.
Mas a fraqueza humana, quando lança
Os olhos no que corre, e não alcança
Senão memória dos passados anos,
As águas que então bebo, e o pão que como,
Lágrimas tristes são, que eu nunca domo
Senão com fabricar na fantasio
Fantásticas pinturas de alegria.

Que, se possível fosse que tomasse
O tempo pera trás, como a memória,
Pelos vestígios da primeira idade,
E, de novo tecendo a antiga história
De meus doces errores, me levasse
Pelas flores que vi da mocidade;
E a lembrança da longa saudade
Então fosse maior contentamento,
Vendo a conversação Ieda e suave
Onde úa e outra chave
Esteve de meu novo pensamento,
Os campos, as passadas, os sinais,
A fermosura, os olhos, a brandura,
A graça, a mansidão, a cortesia,
A sincera amizade, que desvia
Toda a baixa tenção, terrena, impura,
Como a qual outra aigúa não vi mais.
Ah! vãs memórias! onde me levais
O fraco coração, que ainda não posso
Domar este tão vão desejo vosso?

No mais, Canção, no mais; que irei falando,
Sem o sentir, mil anos. E se acaso
Te culparem de larga e de pesada,
- Não pode ser - lhe dize - limitada
A água do mar em tão pequeno vaso.
Nem eu delicadezas vou cantando
Co'o gosto do louvor, mas explicando
Puras verdades já por mim passadas.
Oxalá fora fábulas sonhadas!


Camões


terça-feira, agosto 24, 2004

ALICERÇANDO ESTRUTURAS #1




Edifício Franjinhas, Lisboa, 1965-67 - Prémio Valmor 1971 - Nuno Teotónio Pereira e J. Braula Reis ;Posted by Hello

quinta-feira, agosto 19, 2004

ALICERÇANDO OBJECTOS #1




Gerrit Rietveld (1888-1964) - Cadeira, 1917 considerada o ícone do design do sec.XX ;Posted by Hello

terça-feira, agosto 17, 2004

ALICERÇANDO POESIA #2 - SOPHIA DE MELLO BREYNER ANDRESEN

Mar

De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.




Pudesse Eu

Pudesse eu não ter laços nem limites
Ó vida de mil faces transbordantes
Para poder responder aos teus convites
Suspensos na surpresa dos instantes!






O poema é
a liberdade

Um poema não se programa
porém a disciplina
-sílaba por sílaba-
o acompanha

Sílaba por sílaba
o poema emerge
-como se os deuses o dessem
o fazemos




As Ondas

As ondas quebravam uma a uma
Eu estava só com a areia e com a espuma
Do mar que cantava só para mim.




Fernando Pessoa

Teu canto justo que desdenha as sombras
Limpo de vida viúvo de pessoa
Teu corajoso ousar não ser ninguém
Tua navegação com bússola e sem astros
No mar indefinido
Teu exacto conhecimento impossessivo.

Criaram teu poema arquitectura
E és semelhante a um deus de quatro rostos
E és semelhante a um de deus de muitos nomes
Cariátide de ausência isento de destinos
Invocando a presença já perdida
E dizendo sobre a fuga dos caminhos
Que foste como as ervas não colhidas.


Sophia de Mello Breyner Andresen

segunda-feira, agosto 16, 2004

ALICERÇANDO FOTOS #1




Praça de Londres Posted by Hello


Apesar da utilização do zoom Lisboa ainda tem destas preciosidades.


Quando as fotografias não estiverem identificadas serão minhas.

domingo, agosto 15, 2004

ALICERÇANDO PALAVRAS #2 - le CLÉZIO



Os homens, as mulheres viviam assim, sempre a andar, sem encontrar descanso. Morriam um dia, surpreendidos pela luz do Sol, atingidos por uma bala inimiga, ou então consumidos pela febre. As mulheres punham os filhos no mundo, simplesmente acocoradas na sombra da tenda, amparadas por duas mulheres, com o ventre comprimido pela grande faixa de pano. A partir do primeiro minuto da sua vida, os homens começavam a pertencer à extensão sem limites, à areia, aos cardos, às serpentes, aos ratos, ao vento sobretudo, pois era essa a sua verdadeira família. As meninas de cabelo cobreado cresciam, aprendiam os gestos sem fim da vida. O único espelho que tinham era a extensão fascinante da planície de gesso, sob o céu unido. Os rapazes aprendiam a andar, a falar, a caçar e a combater, simplesmente para aprenderem a morrer na areia.


DESERTO - J.M.G. le CLÉZIO


sexta-feira, agosto 13, 2004

ALICERÇANDO IMAGENS #1 - RAPHAEL





Homem nu com braços levantados - desenho - 1511-12 ;Posted by Hello



Sempre pensei que o esboço contém algo mais que o produto acabado.

Abbas Kiarostami


ALICERÇANDO PALAVRAS #1 - NERUDA


...Tudo o que você quiser, sim senhor, mas são as palavras que cantam, que sobem e descem... Prosterno-me diante delas... Amo-as, abraço-as, persigo-as, mordo-as, derreto-as... Amo tanto as palavras... As inesperadas... As que glutonamente se amontoam, se espreitam, até que de súbito caem... Vocábulos amados... Brilham como pedras de cores, saltam como irisados peixes, são espuma, fio, metal, orvalho... Persigo algumas palavras... São tão belas que quero pô-las a todas no meu poema... Agarro-as em voo, quando andam a adejar, e caço-as, limpo-as, descaco-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebúrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ágatas, como azeitonas... E então revolvo-as, agito-as, bebo-as, trago-as, trituro-as, alindo-as, liberto-as... Deixo-as como estalactites no meu poema, como pedacinhos de madeira polida, como carvão, como restos de naufrágio, presentes das ondas... Tudo está na palavra... Uma ideia inteira altera-se porque uma palavra mudou de lugar, ou porque outra se sentou como um reizinho dentro de um frase que não a esperava, mas que lhe obedeceu... Elas têm sombra, transparência, peso, pernas, pêlos, têm de tudo quanto se lhes foi agregando de tanto rolar pelo rio, de tanto transmigrar de pátria, de tanto serem raízes... São antiquissímas e recentíssimas... Vivem no féretro escondido e na flor que desponta... Que bom idioma o meu, que boa língua herdámos dos torvos conquistadores... Andavam a passo largo pelas tremendas cordilheiras, pelas Américas encrespadas, em busca de batatas, chouriços, feijões, tabaco negro, ouro, milho, ovos fritos, com aquele voraz apetite que nunca mais se viu no mundo... Tudo engoliam, juntamente com as religiões, pirâmides, tribos, idolatrias iguais às que traziam nas grandes bolsas... Por onde passavam ficava arrasada a terra... Mas aos bárbaros caíam das botas, das barbas, dos elmos, das ferraduras, como pedrinhas, as palavras luminosas que ficaram aqui, resplandecentes... o idioma. Ficámos a perder... Ficámos a ganhar... Levaram o ouro e deixaram-nos o ouro... Levaram tudo e deixaram-nos tudo... Deixaram-nos as palavras.



Pablo Neruda


quinta-feira, agosto 12, 2004

ALICERÇANDO POESIA #1 - ÁLVARO DE CAMPOS



Não sei. Falta-me um sentido, um tacto
Para a vida, para o amor, para a glória...
Para que serve qualquer história,
Ou qualquer fato?



Estou só, só como ninguém ainda esteve,
Oco dentro de mim, sem depois nem antes.
Parece que passam sem ver-me os instantes,
Mas passam sem que o seu passo seja leve.



Começo a ler, mas cansa-me o que inda não li.
Quero pensar, mas dói-me o que irei concluir.
O sonho pesa-me antes de o ter. Sentir
É tudo uma coisa como qualquer coisa que já vi.



Não ser nada, ser uma figura de romance,
Sem vida, sem morte material, uma ideia,
Qualquer coisa que nada tornasse útil ou feia,
Uma sombra num chão irreal, um sonho num transe.


1-3-1917

Álvaro de Campos

http://alicerces.blogspot.com Posted by Hello

...da arte em geral


Dando apenas os primeiros passos.

Aqui ficarão registos de arte que são os alicerces da minha existência.